O mundo com menos ajuda: cortes na assistência oficial ao desenvolvimento ameaçam a segurança alimentar global

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Blog do IFZ | 07/06/2025

O mais recente relatório do Centro Comum de Pesquisa da União Europeia soa o alarme sobre uma crise silenciosa, mas devastadora: o colapso do sistema internacional de Assistência Oficial ao Desenvolvimento (Official Development Assistance – ODA) e seus efeitos sobre a segurança alimentar e nutricional global. Sob o governo Trump, os Estados Unidos iniciaram, em janeiro de 2025, um desmonte sem precedentes da U.S. Agency for International Development (USAID) — a principal agência de ajuda externa do país —, com 86% de seus programas cancelados, o equivalente a uma redução de 38% nos fundos obrigatórios só em 2024. O setor agrícola foi o mais atingido em termos absolutos, com corte de 81%, seguido por nutrição (-39%) e saúde materno-infantil (-92%).

As consequências não se limitam à América. Cinco países em situação de insegurança alimentar aguda — Sudão, Palestina, Haiti, Mali e Sudão do Sul — perderão entre 8% e 66% do financiamento total previsto para 2024. A paralisação de dados essenciais ameaça comprometer análises de vulnerabilidade, como as do IPC (Classificação Integrada da Segurança Alimentar em Fases), e enfraquece a capacidade de resposta em contextos de crise.

O impacto global é amplificado pela retração simultânea de outros doadores tradicionais da OCDE. A ajuda dos 22 membros europeus do Comitê de Assistência ao Desenvolvimento caiu 8,6% em 2024, e as projeções indicam uma queda de até 28% até 2026. Com isso, cresce a tendência de realocação de recursos para prioridades nacionais, como migração e defesa, em detrimento da ajuda aos países mais pobres.

As consequências são gravíssimas. A interrupção abrupta dos programas pode significar, segundo estimativas, a morte evitável de até 369 mil crianças por ano devido à desnutrição aguda grave não tratada. O Programa Mundial de Alimentos (World Food Programme – WFP), maior operador humanitário global, projeta queda de 34% em seu orçamento e cortes que podem deixar de atender até 3 milhões de pessoas em situação de fome emergencial. A FAO, por sua vez, perdeu 106 projetos financiados pelos EUA e deverá eliminar até 600 postos de trabalho.

Frente a esse cenário, o relatório recomenda fortalecer os sistemas de dados locais, reduzir a fragmentação da assistência, ampliar a liderança dos países receptores e mobilizar doadores privados. Mas alerta: nenhuma fundação ou país poderá preencher sozinho o vazio deixado pelos Estados Unidos. A resposta exigirá uma transformação profunda na arquitetura da cooperação internacional.

Baixe aqui o relatório “The Impact of Official Development Assistance (ODA) cuts on food security and nutrition – a Knowledge Review