Quando o lucro vale mais que a comida: relatório da ONU expõe concentração corporativa

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Blog do IFZ | 05/09/2025

Baixe aqui o “Report of the Special Rapporteur on the right to food, Michael Fakhri

O novo relatório do Relator Especial da ONU para o Direito à Alimentação, Michael Fakhri, apresentado à Assembleia Geral em julho de 2025, denuncia a crescente concentração de poder corporativo nos sistemas alimentares globais. O documento mostra que um punhado de empresas transnacionais domina setores-chave como sementes, fertilizantes, pesticidas e máquinas agrícolas, moldando não apenas o que se planta e como se produz, mas também os preços, as condições de trabalho e até as políticas públicas.

Segundo Fakhri, essa concentração tem efeitos devastadores: trabalhadores enfrentam salários baixos, longas jornadas e exposição a ambientes inseguros; agricultores tornam-se dependentes de insumos caros e contratos abusivos; comunidades locais são excluídas das decisões; e famílias, em meio à inflação dos alimentos, pagam cada vez mais por dietas menos saudáveis, enquanto corporações registram lucros recordes. O relatório destaca ainda como empresas gastam somas vultosas em lobby para enfraquecer regulações ambientais e sociais, ampliando o desequilíbrio de poder e reduzindo a capacidade de governos protegerem seus cidadãos.

Do ponto de vista do direito humano à alimentação, o quadro é alarmante. Direitos reconhecidos em convenções internacionais tornam-se ilusórios quando o acesso a alimentos depende da lógica de monopólios e da maximização de lucros. Além disso, o modelo industrial de produção impulsionado por grandes conglomerados intensifica a degradação ambiental, contribui para as mudanças climáticas e ameaça a biodiversidade. O avanço das tecnologias digitais no campo, em vez de ampliar a autonomia de agricultores, muitas vezes os aprisiona em plataformas que coletam dados e reforçam a dependência em relação às corporações.

O relatório, porém, não se limita à crítica. Ele propõe medidas concretas para restabelecer o equilíbrio: fortalecer políticas de concorrência e antitruste, aprovar um tratado internacional vinculante sobre empresas e direitos humanos, avançar em um pacto fiscal global sob a ONU até 2027 e apoiar alternativas baseadas na agroecologia, na economia solidária e nos sistemas alimentares locais. Essas medidas são apresentadas como fundamentais para garantir mercados mais justos, conter abusos e proteger a dignidade das pessoas.

A mensagem central é que o debate sobre a concentração corporativa nos sistemas alimentares não pode mais ser adiado. Trata-se de um tema essencial para o futuro da segurança alimentar, da justiça social e da própria democracia. O relatório desafia governos e sociedade civil a escolher entre perpetuar um modelo que gera lucros para poucos e construir sistemas alimentares capazes de garantir direitos, sustentabilidade e dignidade para todos.

Baixe aqui o “Report of the Special Rapporteur on the right to food, Michael Fakhri