Proteção Social Adaptativa segundo o Banco Mundial: construindo resiliência diante dos choques

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Blog do IFZ | 15/09/2025

Baixe aqui o documento “Adaptive Social Protection: Building Resilience to Shocks” produzido pelo Banco Mundial

O mundo enfrenta choques cada vez mais frequentes e devastadores: desastres naturais, crises econômicas, pandemias, conflitos armados e deslocamentos forçados. Esses eventos, muitas vezes simultâneos e interligados, afetam de forma desproporcional os mais pobres e vulneráveis, que dispõem de menos recursos para se proteger, reagir e se recuperar. Nesse cenário, o Banco Mundial desenvolveu o conceito de proteção social adaptativa (Adaptive Social Protection – ASP), uma abordagem que busca fortalecer a resiliência das famílias antes, durante e depois dos choques.

A base conceitual: preparar, enfrentar e adaptar

O Banco Mundial define resiliência como a capacidade de uma família se preparar para um choque, lidar com seus efeitos imediatos e adaptar-se no longo prazo, reduzindo vulnerabilidades futuras. A ASP, portanto, se estrutura em três dimensões principais:

  • Preparar: ampliar o acesso à informação sobre riscos, incentivar a poupança, diversificar instrumentos de proteção (seguros e programas sociais) e possibilitar que as famílias criem reservas antes da crise.
  • Enfrentar (coping): oferecer meios para suavizar perdas de renda e consumo logo após o impacto, evitando estratégias prejudiciais como a venda de ativos ou a retirada de crianças da escola.
  • Adaptar: apoiar mudanças de médio e longo prazo que reduzam a exposição a riscos, como diversificação de meios de vida, fortalecimento de ativos produtivos e, em contextos extremos, até mesmo migração planejada.

Ao integrar essas dimensões, a ASP não apenas protege contra a pobreza imediata, mas também ajuda a evitar que famílias fiquem presas em ciclos de vulnerabilidade.

Quatro blocos estruturantes da ASP

O Banco Mundial propõe quatro eixos fundamentais para a proteção social adaptativa:

  1. Programas: fortalecer e expandir os sistemas de proteção social, com destaque para as redes de segurança (safety nets). Isso inclui adaptar critérios de elegibilidade para incorporar riscos climáticos, prever expansões verticais (aumento temporário de benefícios) e horizontais (inclusão de novos beneficiários em crises), além de integrar medidas de inclusão produtiva e de fortalecimento do capital humano.
  2. Dados e informação: integrar registros sociais a dados de risco climático e socioeconômico, garantindo atualização constante e cobertura adequada em áreas de maior vulnerabilidade. Também é essencial conectar programas sociais a sistemas de alerta precoce e a mecanismos de avaliação de necessidades pós-desastre.
  3. Financiamento: desenvolver estratégias de financiamento de risco que assegurem recursos disponíveis de forma antecipada. Isso pode incluir fundos de contingência, linhas de crédito emergenciais e seguros paramétricos, estruturados para cobrir eventos de diferentes intensidades e frequências.
  4. Arranjos institucionais e parcerias: promover liderança governamental, coerência de políticas entre setores (proteção social, gestão de riscos de desastres e adaptação climática), fortalecimento institucional e parcerias estratégicas com atores não governamentais e humanitários.

Essa arquitetura permite que a proteção social seja não apenas reativa, mas também preventiva e transformadora.

Exemplos de aplicação

A experiência internacional mostra que a ASP pode fazer diferença concreta:

  • Quênia: o Hunger Safety Net Programme possui mecanismos de expansão horizontal automática em caso de seca, acionados por indicadores climáticos.
  • Filipinas: sessões comunitárias vinculadas ao programa de transferência de renda condicional são usadas para disseminar informações sobre preparação e resposta a desastres.
  • Sahel (África): programas de inclusão produtiva apoiados pelo Banco Mundial promovem diversificação de meios de vida em comunidades altamente expostas à seca, reduzindo a vulnerabilidade estrutural.

Esses exemplos mostram que sistemas de proteção social já existentes podem ser ajustados para lidar com choques de forma mais eficaz, desde que contem com dados robustos, financiamento previsível e coordenação institucional.

Pontos de conexão com outras iniciativas

O conceito do Banco Mundial dialoga com propostas de outros organismos globais. A FAO, por exemplo, enfatiza a importância da ação antecipatória, ou seja, agir antes que a crise se materialize, com base em gatilhos de alerta precoce. Já o ASPIRE, desenvolvido pelo IIED, propõe indicadores que avaliam até que ponto os programas sociais estão preparados para incorporar essa lógica. Essas abordagens convergem em uma mesma mensagem: os sistemas de proteção social precisam ser flexíveis, inclusivos e capazes de responder aos riscos crescentes.

Desafios e caminhos futuros

Apesar dos avanços conceituais, os desafios para consolidar a ASP são significativos. Muitos países ainda apresentam baixa cobertura de redes de proteção social, especialmente em regiões de maior risco climático. Além disso, faltam recursos estáveis para financiar respostas rápidas e mecanismos de coordenação que integrem proteção social, adaptação climática e gestão de riscos de desastres.

Outro ponto crucial é garantir que a ASP seja justa e inclusiva, alcançando de forma efetiva mulheres, crianças, povos indígenas, migrantes e outros grupos historicamente marginalizados. Sem esse compromisso, há o risco de reforçar desigualdades em vez de reduzir vulnerabilidades.

Conclusão

O conceito de proteção social adaptativa do Banco Mundial amplia o horizonte da política social, colocando-a no centro da agenda de resiliência climática e de gestão de riscos. Ao investir nas capacidades de preparar, enfrentar e adaptar, governos podem não apenas proteger o bem-estar imediato das famílias, mas também abrir caminhos para uma vida mais resiliente e segura.

Combinada a outras iniciativas globais, a ASP reforça a ideia de que não basta reagir às crises: é preciso antecipá-las, integrar políticas e garantir que os sistemas sociais atuem como motores de transformação. O desafio é grande, mas a oportunidade de alinhar proteção social e adaptação climática pode definir a qualidade de vida de milhões de pessoas nos próximos anos.

Baixe aqui o documento “Adaptive Social Protection: Building Resilience to Shocks” produzido pelo Banco Mundial