Nota sobre estimativas de fome e insegurança alimentar para o Brasil

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Rede PENSSAN | 17/07/2023

O objetivo desta nota informativa é abordar as tendências da fome e da insegurança alimentar no Brasil apontadas nas estimativas da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) sobre a prevalência de subalimentação e prevalência de insegurança alimentar moderada ou grave divulgadas no relatório Estado de Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo 2023 (SOFI 2023). Adicionalmente, compara essas estimativas com resultados de pesquisas nacionais no Brasil baseadas na Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), de 2004 a 2022.

Prevalência de Subalimentação – PoU (Indicador ODS 2.1.1)

A Prevalência de Subalimentação (Prevalence of Undernourishment – PoU) é o indicador indireto da fome utilizado há muitos anos pela FAO que passou a integrar os indicadores da Agenda 2030 da ONU (indicador 2.1.1) associado ao 2º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável/ODS2). Este objetivo conclama os países a erradicarem a fome e promoverem vida digna a todos até 2030, dentro das condições que o nosso planeta oferece e sem comprometer a qualidade de vida das próximas gerações.
A PoU é calculada com base em estimativas em nível nacional de:

  • consumo médio de calorias alimentares que, por sua vez, é derivado de estimativas de oferta
    média de calorias per capita oriundas das Folhas de Balanço Alimentar da FAO;
  • desigualdade no consumo de calorias pela população;
  • características da população nacional que determinam o requerimento mínimo de calorias
    utilizado para estabelecer a inadequação do consumo de energia da dieta.

As estimativas de prevalência de subalimentação são divulgadas como médias de 3 anos e apenas se forem superiores a 2,5%. Entre 2018-2020 a PoU para o Brasil era < 2,5%. Porém, a média do período de 2020-2022 para o país é de 4,7% da população, equivalente a 10,1 milhões de pessoas.

Insegurança alimentar moderada ou grave baseada na Food Insecurity Experience Scale – FIES

A FAO coleta dados em mais de 140 países, desde 2014, inclusive no Brasil, por meio da Gallup World Poll utilizando a FIES também incluída entre os indicadores do ODS2 (indicador 2.1.2). Suas estimativas de segurança alimentar no Brasil estiveram relativamente estáveis de 2014 a 2018 (Tabela 1), entretanto, confirmaram dados de outras fontes de investigação que mostraram o aumento significativo da insegurança alimentar de 2018-20 a 2020-22.

Tabela 1

Estimativas nacionais com medidas diretas de insegurança alimentar com base na Escala Brasileira de Insegurança Alimentar

A comparação dos resultados dos inquéritos conduzidos pelo IBGE (2004-2018) e pela Rede PENSSAN (2021 e 2022) com as estimativas da FAO (2020/2021/2022) deve considerar que:

  • Os resultados divulgados pelo IBGE e a Rede PENSSAN, com base na Escala Brasileira de
    Insegurança Alimentar (EBIA), classificam os domicílios em 4 categorias: segurança
    alimentar e três níveis de insegurança alimentar (leve, moderada e grave);
  • As estimativas de insegurança alimentar da FAO baseadas na FIES, no entanto, são
    relatadas apenas para duas categorias: insegurança alimentar moderada ou grave
    (somadas) e apenas insegurança alimentar grave. Não há a categoria de insegurança
    alimentar leve;
  • Os limiares (ou pontos de corte) que estabelecem as categorias de gravidade da insegurança alimentar pela EBIA e pela FIES são distintos resultando em estimativas distintas quanto a insegurança alimentar grave (onde ocorre a fome);
  • Os resultados do IBGE e da PENSSAN são diretamente comparáveis entre si, porém, não são diretamente comparáveis com as estimativas da FAO.

Os números da FAO são baseados na escala global da FIES com uso de limiares que permitem produzir resultados para cada um dos 140 países, com garantia de comparabilidade entre eles. O limiar para categorizar os entrevistados como em insegurança alimentar grave é maior na escala global de gravidade da FIES em comparação com a EBIA. Isto é, segundo a escala global da FIES, as pessoas entrevistadas são classificadas como em insegurança alimentar grave quando apresentam um grau de restrição de acesso aos alimentos muito mais elevado do que aquele adotado pela EBIA. Portanto, as estimativas da FAO apresentam um percentual menor de prevalência de insegurança alimentar grave em comparação com as estimativas do IBGE e da Rede PENSSAN.

Não obstante, é importante observar que:

  • A prevalência de insegurança alimentar moderada somada à grave é similar nos resultados da FAO divulgados recentemente 1 e nos do II VIGISAN2 realizado pela Rede PENSSAN em 2021-2022, confirmando que a diferença nas prevalências está relacionada, fundamentalmente, nos diferentes pontos de corte da categoria mais grave de insegurança alimentar.
  • As tendências de estimativas da insegurança alimentar apontam na mesma direção: aumento acentuado da insegurança alimentar no Brasil nos últimos anos.
Quadro 1

Como outras publicações na mídia nacional têm apontado, a maioria do povo brasileiro vive, nos últimos anos, em situação muito grave de violação de seu direito humano à alimentação adequada, o que causa muito sofrimento e impacto na sua saúde e bem-estar. Há evidências científicas claras da necessidade de políticas públicas efetivas de combate à fome e promoção de alimentação saudável, tanto emergenciais como e, principalmente, estruturais. Sabemos por experiência anterior, que a reconstituição das políticas públicas de SAN, associadas a outras de caráter estruturante poderão em curto período de tempo reverter esse quadro que fere a dignidade humana.

Coordenação da Rede PENSSAN
17 de Julho de 2023


(1) FAO, IFAD, UNICEF, WFP and WHO. 2023. The State of Food Security and Nutrition in the World 2023.Urbanization, agrifood systems transformation and healthy diets across the rural–urban continuum. Rome, FAO.
https://ifz.org.br/download/3936/?tmstv=1689629642&v=3937

(2) Rede PENSSAN; II Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da COVID-19 no Brasil [livro eletrônico]: II VIGISAN : relatório final. /Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar – PENSSAN. – São Paulo, SP.
https://ifz.org.br/wp-content/uploads/2023/03/VIGISAN-II-2022-Inseguranca-Alimentar-e-Covid-19-no-Brasil.pdf

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https://ifz.org.br/download/4006/?tmstv=1689629948&v=4007