O que acontece em Nova York não fica em Nova York

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Pacto para o Futuro da ONU impacta na decisão de quem vamos eleger no domingo

Ilona Szabó de Carvalho na Folha de S.Paulo | 01/10/2024

Baixe aqui o documento “Pact for the Future, Global Digital Compact, and Declaration on Future Generations

Em dias intensos em Nova York, na semana passada, as nações reunidas na Cúpula do Futuro da ONU proclamaram por consenso o Pacto para o Futuro, o conjunto de 56 medidas para enfrentar os maiores desafios globais.

Por uma iniciativa inédita do G20, com o Brasil à frente, líderes das maiores economias do mundo fizeram um chamado à ação dentro da ONU, fazendo a ligação entre as discussões nesse grupo seleto e o pacto acordado na Cúpula do Futuro.

Sim, sete países, entre eles Rússia e Argentina, resistiram ao pacto. Também se questionou a ausência de vários chefes de Estado de peso durante a cúpula.

Ninguém quer ser Poliana a ponto de imaginar coesão global num encontro marcado pelo início da guerra entre Israel e Irã dentro do Líbano, escalando o conflito no Oriente Médio ao mesmo tempo em que se clamava em Nova York pela cooperação entre países para agir na proteção das pessoas e do planeta.

No entanto, o estado atual das coisas não nos deixa tempo para lamentos. Temos de avançar no que conseguimos construir. Nesse sentido, foi uma baita conquista. Basta lembrar que, em suas primeiras versões, o pacto não falava em clima.

O camaronês Philemon Yang, presidente da Assembleia-Geral da ONU, discursa na Cúpula do Futuro – Wu Xiaoling – 22.set.24/Xinhua

Evoluímos nos acordos para limitar o aquecimento global a 1,5°C. Assinamos o compromisso de reduzir o uso de combustíveis fósseis e fazer a transição para fontes renováveis. Chamamos para a nossa geração a responsabilidade por regular a inteligência artificial e o espaço digital. Recolocamos na agenda o fim das armas nucleares, realidade nada distópica em que estamos metidos.

E agora? Nosso trabalho é descer esse pacto para o dia a dia das pessoas. É importante mostrar que as decisões tomadas nesse nível quase etéreo da cooperação internacional têm efeito cascata.

Nenhum país consegue resolver esses desafios sozinhos. Como é possível combater as mudanças climáticas se algo que acontece na floresta amazônica ganha dimensão continental? Como se pode falar em segurança se um ataque nuclear na Europa pode devastar o mundo inteiro? São questões que atravessam fronteiras.

Com esse pacto firmado, é preciso, dentro de cada país, ir descendo para o local, as cidades, as comunidades. Porque lá na camada de cima, muitas vezes, falta o senso de realidade, falta o sapato apertado de quem está sofrendo com a desigualdade, a pobreza, a fome. Mas é uma via de mão dupla. Os acordos internacionais são o nosso instrumento de trabalho e de cobrança e devem ser incorporados por quem entrega as políticas públicas na ponta.

É impossível não conectar esse cenário ao fato de que, no próximo domingo, vamos eleger prefeitos e vereadores, que têm um papel a cumprir na implementação das ações globais. Como temos visto com frequência alarmante, os governos locais vêm passando ao largo das agendas pautadas pela ciência e pelos avanços rumo à justiça social e climática, tão duramente conquistados.

O prefeito Ricardo Nunes (MDB), o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), o influenciador Pablo Marçal (PRTB) e a deputada federal Tabata Amaral (PSB) em entrevista em dia de debate Folha/UOL
Os quatro candidatos mais bem posicionados para a eleição em São Paulo – Jonas Santana e Pedro Affonso/Folhapress

O que temos vivido em nossas cidades, desde o garimpo e o desmatamento desenfreado até os desastres das enchentes e queimadas, tem consequências para as nossas vidas e para o mundo. E as cidades, onde vivem 85% dos brasileiros, podem ser tanto a causa como a solução do colapso ecológico.

O nosso papel é o de fazer escolhas que protejam o nosso presente e o futuro que acordamos.

Baixe aqui o documento “Pact for the Future, Global Digital Compact, and Declaration on Future Generations

Ilona Szabó de Carvalho é Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

Publicado originalmente na Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/ilona-szabo/2024/10/o-que-acontece-em-nova-york-nao-fica-em-nova-york.shtml