Primeira região árida do Brasil é registrada na Bahia e pode expandir até Pernambuco

Pesquisador Carlos Magno alerta para os riscos e aponta iniciativas que o poder público pode tomar para frear mudança

Por Vinícius Sobreira e Rodolfo Rodrigo no Brasil de Fato | 27/02/2024

RECIFE (PE) | Estudo divulgado no fim de 2023 pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE) registrou pela primeira vez no Brasil uma região de clima árido, com redução de nuvens, diminuição das chuvas e aumento da incidência de radiação solar de ondas longas sobre a terra. As características permitem classificar a região, no norte da Bahia, como árida.

Sobre o tema, o programa, o Brasil de Fato Pernambuco entrevistou Carlos Magno, mestre em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável. Magno também é coordenador do Centro Sabiá e integrante da Plataforma Semiáridos, iniciativa em defesa dos semiáridos da América Latina, liderada pela ONG estrangeira Coalização Internacional pela Terra (ILC).

Magno destaca que o problema não é exatamente novo. “A mancha de território árido entre a Bahia e Pernambuco é consequência de um processo que tem acontecido há pelo menos 20 anos, segundo o INPE.” As fotografias de satélites mostram que a região semiárida do Nordeste cresceu 48% entre 1999 e 2022. “Um aumento de 430 mil hectares”, pontua ele.

Há mais água evaporando do solo e das plantas do que retornando via chuvas. “Está chovendo pra cima”, resume Carlos. “Isso resulta na distribuição dos ecossistemas e na falta de vegetação. Nessa área a formação de nuvens é muito menor que noutras, o que torna essa área mais atingida por radiação solar, com mais evaporação”, diz ele.

Com menos nuvens, menos chuvas e mais sol, o caminho natural, segundo Carlos Magno, é que essas regiões se tornem desertos. “Mesmo que as chuvas voltem ao normal, o solo já está degradado, não produzi mais comida”, lamenta. E segundo ele a tendência é de crescimento no tamanho das áreas nessa situação.

Papel do Governo

O articulador social sugere que os poderes públicos, especialmente a União e os governos estaduais, precisam dar a devida atenção ao problema. “Precisamos de políticas estaduais, nacionais, planos e orçamentos generosos para que essas populações consigam se adaptar e mitigar os efeitos causados por esse processo climático”, propõe Carlos. “Precisamos investir em tecnologias sociais para universalizar o acesso a água para essas populações”, diz ele.

Na avaliação do especialista, o Brasil – tanto o governo como a sociedade – “não temos dado a devida importância a esse problema, que é lento, mas é grave. Não tomamos consciência desse processo”, diz ele. “A população nem sabe e nem entende o que está acontecendo, porque não é algo fácil de explicar”, completa.


Pela primeira vez foi registrada uma região árida no Brasil, no norte da Bahia / Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

No Brasil, quando as pessoas pensam em lugar seco, pensam no Sertão. Acontece que nem sempre o Sertão foi assim. É um quadro que vem mudando, piorando”, diz Magno. Ele lembra ainda que há cidades grandes nessas regiões. “Além dos centros urbanos, há comunidades rurais que vivem exclusivamente de recursos da agricultura e que estão sendo duramente afetadas”, lamenta.

Cerca de 27 milhões de pessoas (13% da população brasileira) vive no nosso semiárido, composto por 1.427 municípios, que fazem deste o semiárido mais populoso do mundo. Dentro da nova região árida no norte da Bahia estão boa parte dos municípios da região do Itaparica (Abaré, Chorrochó, Macururé e parte de Rodelas), sendo “poupados” os vizinhos Glória e Paulo Afonso. Na região do Sertão do São Francisco trechos de Curaçá e Juazeiro também se tornaram áridos.

Em Pernambuco, os municípios de Petrolina, Santa Maria da Boa Vista, Orocó, Cabrobó, Belém do São Francisco e Itacuruba fazem fronteira com essas regiões áridas baianas

Publicado originalmente pelo Brasil de Fato
https://www.brasildefatope.com.br/2024/02/26/no-norte-da-bahia-primeira-regiao-arida-do-brasil-tende-a-aumentar-e-pode-afetar-pernambuco