José Graziano da Silva | Novembro de 2024
Baixe aqui o artigo “Agricultura familiar: uma opção cem por cento“, em Português
Descargue aquí el artículo “Agricultura familiar, una opción cien por cien“, en Español
Download the article “Family farming, a one hundred percent option” here, in English
Em outubro de 2024, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e o Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (FIDA) convocaram um seminário para marcar o “meio termo” da Década das Nações Unidas para a Agricultura Familiar (2019-2028). O evento contou com uma série de iniciativas para garantir uma celebração marcante, incluindo a construção de um celeiro de madeira, o “farm barn”, nos jardins de entrada da FAO em Roma. Além disso, foi lançada uma página especial na web, reunindo materiais preparados para a ocasião. Entre os “Key Facts” apresentados na web, constava que “as explorações agrícolas familiares produzem mais de 80% dos alimentos do mundo em termos de valor, confirmando a importância central da agricultura familiar na segurança alimentar global atual e para as gerações futuras.” Essa afirmação foi repetida diversas vezes durante o evento por diferentes atores, incluindo o Diretor-Geral da FAO, Qu Dongyu.
O que chamou minha atenção não foi apenas a magnitude do número — aqui no Brasil, onde alguns ainda se consideram os maiores do mundo, fala-se em 70%! — mas também a precisão da referência aos “alimentos do mundo em termos de valor”. Escrevi aos organizadores solicitando mais informações, na expectativa de que houvesse algum novo “background paper” elaborado pela organização para fundamentar o dado, o que costuma acontecer na FAO. Contudo, dessa vez, não era o caso: não há nenhum respaldo novo para sustentar essa afirmativa!
Compartilho a resposta recebida para ilustrar as limitações dessa informação:
“A fonte primária dessa informação sobre a agricultura familiar é um documento de apoio preparado para o relatório The State of Food and Agriculture de 2014. Os números foram incluídos no SOFA 2014 (pp. xi–9). E uma versão atualizada do estudo foi publicada em 2019, coincidindo com o lançamento da Década da Agricultura Familiar (UNDFF). Os números permaneceram inalterados e também foram usados no Plano de Ação Global da UNDFF (GAP).
Os autores derivaram esses dados com base em evidências de que as propriedades familiares ocupam cerca de 70–80% das terras agrícolas. O documento estima a participação da produção de alimentos das propriedades familiares, independentemente do tamanho, usando a parcela de terras que elas operam como um indicador aproximado para sua participação no valor da produção de alimentos. Utilizando o valor da produção de alimentos em 2015 em nível nacional e multiplicando-o pela parcela de terras operadas por propriedades familiares, o estudo encontrou que a média ponderada entre 53 países era de 77%. Com base nisso, conclui-se que os agricultores familiares produzem cerca de 80% dos alimentos do mundo em termos de valor. Portanto, não temos dados precisos sobre a quantidade de alimentos produzidos pelas propriedades familiares, apenas dados agregados em nível nacional sobre o valor da produção de alimentos no PIB, independentemente da quantidade.”
No texto que segue, vou procurar mostrar que a relevância da agricultura familiar não deve ser medida apenas pela sua contribuição à produção de alimentos de forma genérica. Como mencionado muitas vezes no passado, os agricultores familiares eram vistos como um problema a ser resolvido e como alvo de políticas sociais, com potencial produtivo limitado. Essa é a mentalidade que precisamos mudar, mesmo hoje.
Os agricultores familiares não fazem parte apenas do “problema” da pobreza rural; na verdade, eles podem ser também parte da solução para a segurança alimentar e o desenvolvimento sustentável, se apoiados por políticas públicas. Vale lembrar que um dos principais motores do avanço tecnológico no início da Revolução Verde dos anos 60/70 foi a mecanização, que favoreceu operações em unidades de maior escala. Na época, o pequeno tamanho das propriedades familiares era percebido como um obstáculo significativo para sua sobrevivência competitiva. No entanto, os avanços, particularmente das tecnologias digitais, mudaram completamente essa percepção nos dias de hoje.
Gostaria de relembrar porque iniciamos tudo isso na FAO. Cerca de 15 anos atrás, as propriedades familiares eram chamadas por amplos segmentos da academia e entre as organizações do sistema das Nações Unidas de “pequenos produtores”, principalmente porque cerca de 90% delas operavam em áreas menores que 2 hectares, de acordo com estimativas da própria FAO. No entanto, como sabemos, discussões sobre o tamanho das propriedades ignoram diferenças na qualidade da terra e nos contextos socioeconômicos em que operam, enquanto a produção das propriedades varia significativamente dependendo desses fatores.
Reconhecer a centralidade da agricultura familiar exigiu uma mudança de narrativa e de percepção, passando do foco exclusivo no tamanho das propriedades e sua contribuição para a produção de alimentos para destacar a relevância desse grupo, não apenas para a segurança alimentar, mas também para o desenvolvimento sustentável de forma geral e na preservação da biodiversidade, em particular.
Além disso, as famílias que gerenciam pequenas propriedades possuem fontes de renda diversificadas, não apenas provenientes da produção agropecuária, mas também de mercados de trabalho agrícolas e de atividades não-agrícolas. Estudos recentes indicam que essa diversificação das fontes de renda tem crescido e tende a aumentar ainda mais a parcela proveniente das rendas não-agrícolas no futuro, impulsionada pela crescente urbanização do mundo rural. Esse é outro aspecto que a nossa “herança agrária” continua a impedir de pensar novas políticas não-agrícolas para o mundo rural.
No início dos anos 1990, buscando estabelecer sua própria identidade, pequenos agricultores de diferentes regiões começaram a trocar experiências e coordenar esforços por meio de organizações regionais e plataformas internacionais. Muitas das principais organizações regionais e internacionais de hoje foram criadas nesse período, incluindo La Via Campesina (1993), a Confederação das Organizações de Produtores Familiares do Mercosul (COPROFAM, 1994), a Rede de Organizações Camponesas e de Produtores da África Ocidental (ROPPA, 2000) e a Associação de Agricultores Asiáticos para o Desenvolvimento Rural Sustentável (AFA, 2002).
Um dos principais impulsionadores desse processo era levar as perspectivas específicas dos então chamados “pequenos produtores” à atenção dos governos nacionais, com o objetivo de promover políticas públicas específicas para esse segmento. Apesar da considerável heterogeneidade entre eles, uma característica definidora estava sempre presente: eram geridas por famílias ou por um ou mais membros da família.
Por isso, a FAO, o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) e o Programa Mundial de Alimentos (PMA) lançaram, em 22 de novembro de 2013, na sede da ONU em Nova York, o Ano Internacional da Agricultura Familiar (2014), que marcou o início de um esforço global para destacar o potencial dos agricultores familiares em erradicar a fome, preservar os recursos naturais e promover o desenvolvimento sustentável. Na ocasião, falando em nome da FAO, afirmei: “Ao escolher celebrar este ano, reconhecemos que os agricultores familiares são figuras centrais na resposta à dupla urgência que o mundo enfrenta hoje: melhorar a segurança alimentar e preservar os recursos naturais.”
O Ano Internacional da Agricultura Familiar nos deu a oportunidade de começar a revitalizar esse setor crucial. Anos depois, conseguimos aprovar na Assembleia Geral a Década da Agricultura Familiar da ONU (2019–2028), onde reafirmamos que os agricultores familiares devem estar no centro da abordagem dos desafios duplos que o mundo enfrenta atualmente: melhorar a segurança alimentar enquanto preservamos os recursos naturais cruciais para nossa própria sobrevivência.
E chegamos em 2024: cinco anos após o lançamento da Década da Agricultura Familiar, a FAO e o IFAD sediaram o Fórum Global de Agricultura Familiar em Roma, com o tema “Comida boa para todos, hoje e amanhã”. O evento destacou o papel dos agricultores familiares como centrais para o fornecimento de alimentos nutritivos e diversos para todos. Importante assinalar que não estamos mais falando apenas de alimentos em geral, mas de “alimentos nutritivos e diversos”, o que traz implícito o reconhecimento do seu papel na preservação da biodiversidade.
Assim, apesar de reconhecer o papel crucial dos agricultores familiares na alimentação do mundo, especialmente nos países de baixa e média renda, acreditamos que seu valor não deve ser limitado apenas à produção de alimentos em geral. Essa também é a opinião de Dion et al. (2023), que enfatizam que “muitos debates sobre o futuro das pequenas propriedades se concentram apenas na produção agrícola, em vez de considerar todo o contexto dos meios de subsistência das famílias agrícolas, que incluem atividades fora da propriedade ou o sistema agroalimentar do qual dependem para comprar insumos e vender produtos. O futuro das pequenas propriedades deve, em vez disso, ser avaliado sob uma perspectiva holística de meios de subsistência e sistema agroalimentar.”
É preciso dizer que a estimativa amplamente citada de que agricultores familiares produzem mais de 80% dos alimentos do mundo, com base em dados de 2014, pode ser questionada por vários estudos recentes. Por exemplo, um documento de apoio também preparado para o SOFI 2024 estimou que propriedades familiares com menos de 2 hectares globalmente produzem cerca de 30–34% do suprimento alimentar (Ricciardi et al., 2018). Mas, como reconhecem os próprios autores, também essa estimativa tem sido questionada, começando pela definição do que compõem a lista dos “alimentos que consumimos”. Mais importante ainda, independentemente de a estimativa correta ser 80% ou 30-34% do total de alimentos que consumimos (simplificadamente 3/4 ou 1/3), as evidências estatísticas mais recentes sugerem que essa contribuição tem diminuído na última década, especialmente em países mais desenvolvidos, mas também em países menos desenvolvidos.
O caso do Brasil, um dos maiores produtores de alimentos do mundo, exemplifica bem essa tendência. No início da década de 1980, por exemplo, era amplamente aceito que as propriedades familiares contribuíam com cerca de 70% da produção de alimentos. Esse número vinha de uma suposta “média” para simplificar a longa lista das tabulações por produto dos censos agropecuários dos anos 1960 a 1990 da produção relativa dos “pequenos produtores” estratificados pelo tamanho dos estabelecimentos. Hoffmann (2015) mostrou as dificuldades associadas a esse número de 70%, argumentando que “é praticamente impossível avaliar, com precisão razoável, qual é a parcela da matéria-prima usada na produção dos alimentos consumidos no Brasil que se origina da produção da agricultura familiar”. Além disso, é muito difícil separar o que é alimento consumido pelos seres humanos de outros usos.
Os cuidadosos trabalhos de Mauro del Grossi, a partir da definição legal atualmente vigente da categoria “agricultura familiar”, mostraram que, apesar de uma pequena redução no número e na área total ocupada pela categoria, a sua participação no valor da produção reduziu-se acentuadamente, caindo de 35% para 23% entre os censos agropecuários de 2006 e 2017. Essa queda acentuada reflete uma drástica redução na participação de culturas alimentares básicas, como o arroz, que caiu de 34% para 11% entre 2006 e 2017; do feijão (todas as variedades), que passou de 72% para 23%; do milho, de 46% para 12%. Quedas menores, mas também importantes, ocorreram no valor da produção da agricultura familiar na mandioca, que caiu de 85% para 70%, e até mesmo na horticultura, que caiu de 65% para 60% entre 2006 e 2017. A julgar pelas informações disponíveis sobre a expansão do agronegócio nos últimos anos, essa queda da produção da agricultura familiar deve ter se acentuado ainda mais na presente década.
Mas a redução da participação das unidades familiares na produção de alimentos significa que sua contribuição para o desenvolvimento sustentável futuro é menos significativa? Argumento o contrário: a importância da agricultura familiar tem aumentado por pelo menos três razões.
Primeiro, elas contribuem para a sustentabilidade dos sistemas agroalimentares ao preservar a diversidade genética de cultivos e rebanhos e ao apoiar os serviços ecossistêmicos. Como destacado por Dion et alii (2023), as pequenas propriedades cultivam uma maior diversidade de culturas e abrigam mais biodiversidade não agrícola, tanto em escalas de propriedade quanto de paisagem, em comparação com propriedades maiores. Elas também plantam uma variedade maior de culturas tradicionais e preservam recursos genéticos por meio do cultivo de variedades locais. Além disso, pequenas propriedades frequentemente possuem mais cobertura de árvores do que as propriedades maiores, contribuindo para o armazenamento de carbono acima e abaixo do solo, o que gera benefícios globais para a mitigação das mudanças climáticas. As árvores também melhoram a infiltração de água, beneficiando outros usuários de água na paisagem e em regiões a jusante.
Em segundo lugar, de acordo com o Banco Mundial (2016), dois terços dos extremamente pobres vivem em áreas rurais, e os meios de subsistência de dois a três bilhões de pessoas rurais – muitas vezes as mais inseguras em termos de alimentos e vulneráveis – ainda dependem principalmente de pequenas propriedades familiares. Contudo, os próprios domicílios dessas propriedades frequentemente não conseguem arcar com os custos de uma dieta nutritiva, especialmente nas regiões mais pobres. Como tem insistido a FAO, o fato de serem pequenos produtores de alimentos não assegura que sejam bem alimentados!
E, em terceiro lugar, as propriedades familiares produzem uma parcela significativa dos alimentos mais nutritivos de que o mundo mais precisa hoje, como frutas, verduras e legumes (FVL). É importante destacar que a produção mundial de FVL ainda é insuficiente para garantir uma dieta saudável em muitas regiões, com exceção de parte da Ásia, segundo o SOFI 2024, considerando a necessidade básica de 400g por dia recomendada pela OMS. Essa lacuna representa uma grande oportunidade para promover políticas de fortalecimento da agricultura familiar com o objetivo de aumentar a produção de FVL, um segmento particularmente intensivo em mão de obra.
Em resumo, concordo com Diao et alii (2023) que as mudanças climáticas e as transformações econômicas atuais criarão desafios e oportunidades para os agricultores familiares na próxima década.
“Algumas pequenas propriedades comerciais continuarão focadas nas culturas tradicionais de exportação – por exemplo, cacau em Gana, algodão no Mali e café na Etiópia – enquanto um número crescente se voltará para produtos que atendem às dietas diversificadas dos crescentes mercados urbanos domésticos. Isso inclui frutas, vegetais, peixes, aves, óleos comestíveis, leite e grãos como a soja. Produtos não cereais são particularmente intensivos em mão de obra e muitas vezes carecem de economias de escala, permitindo que as pequenas propriedades permaneçam competitivas. Com o tempo, esperamos uma maior especialização no cultivo de produtos de alto valor e um afastamento da combinação de culturas de caixa e de subsistência, semelhante ao que se observa entre os agricultores especializados em vegetais (…) ou criadores especializados de aves e suínos.”
Durante a preparação para a Conferência de Agricultura Familiar em 2024, a FAO e o IFAD apresentaram um documento básico de orientação, destacando o potencial da agricultura familiar da seguinte forma:
“Existem mais de 550 milhões de propriedades familiares em todo o mundo, representando mais de 90% do total de 608 milhões de propriedades. Noventa e quatro por cento dessas propriedades têm menos de 5 hectares, representando coletivamente apenas 17% da área agrícola total, com 98% menores que 50 hectares (Lowder, Sánchez e Bertini, 2021). A prevalência de pequenas propriedades é mais pronunciada em países de baixa e média-baixa renda (principalmente na Ásia Oriental, Pacífico, Sul da Ásia e África Subsaariana). Nessas regiões, cerca de 80% das propriedades têm menos de 2 hectares, operando cerca de 30–40% das terras, uma proporção muito maior do que em outras regiões (Painel de Alto Nível de Especialistas [HLPE], 2013).
“Os tamanhos médios das propriedades variam de acordo com a região e o nível de renda do país. Em países de baixa renda, observou-se uma tendência significativa de aumento no número de unidades e redução no tamanho médio das propriedades. Os pequenos e médios agricultores familiares não estão desaparecendo, mas se adaptando e transformando para lidar com a instabilidade e imprevisibilidade (por exemplo, eventos de progressão lenta, desastres naturais e conflitos) (Giller e Andersson, 2024). Essa persistência pode ser atribuída a vários fatores que impactam a eficácia das soluções políticas tradicionais. Esses fatores incluem uma crescente pluriatividade, particularmente entre os pequenos agricultores familiares, para reduzir sua dependência exclusiva da agricultura, diversificando as fontes de renda com empregos fora da fazenda; aspectos culturais; e elementos relacionados ao uso da terra, como o uso da terra como rede de segurança na ausência de aposentadorias rurais ou devido à precariedade do emprego fora da fazenda (Rigg, Salamanca e Thompson, 2016).
“Coletivamente, os agricultores familiares produzem 80% dos alimentos do mundo em termos de valor (FAO e IFAD, 2019). Em países de baixa e média renda, os pequenos agricultores, com menos de 20 hectares, produzem 70% dos alimentos. Essas pequenas propriedades apresentam maior diversidade de culturas. Globalmente, há uma relação inversa entre o tamanho das propriedades e o número de espécies de culturas presentes, sendo que as propriedades menores sustentam uma maior biodiversidade não agrícola (Herrero et al., 2017; Ricciardi et al., 2021).
“As evidências mostram que os agricultores familiares desempenham um papel significativo na contribuição para a segurança alimentar e na viabilização de dietas mais diversas, nutritivas e saudáveis. Eles também aumentam a biodiversidade enquanto promovem o uso eficiente e sustentável e o manejo de recursos naturais. A multifuncionalidade da agricultura familiar também abrange a preservação e transmissão de conhecimento e cultura (FAO e IFAD, 2019).
“A agricultura familiar é caracterizada por uma relação única entre a família e a propriedade, abrangendo dimensões que vão além da produção, incluindo atividades não agrícolas diversas. A família e a propriedade são parte integrante da economia rural, e suas práticas – que incluem produção, processamento, comercialização, consumo e reprodução social – estão profundamente enraizadas nos territórios locais.
Essas práticas interagem continuamente, combinam-se e transformam-se mutuamente, renovando recursos ecológicos, econômicos e sociais (FAO e IFAD, 2019).”
Permitam-me concluir citando o Plano de Ação Global da FAO e do IFAD (2019) para a Década da Agricultura Familiar da ONU, 2019–2028:
“Os agricultores familiares demonstraram sua capacidade de desenvolver novas estratégias e respostas inovadoras aos desafios sociais, ambientais e econômicos emergentes. Eles fazem mais do que produzir alimentos – cumprem simultaneamente funções ambientais, sociais e culturais e atuam como guardiões da biodiversidade ao preservar paisagens e conservar o patrimônio comunitário e cultural. Além disso, possuem o conhecimento para produzir alimentos nutritivos e culturalmente apropriados, dentro do marco das tradições indígenas.
“De fato, nada está mais próximo do paradigma de produção alimentar sustentável do que a agricultura familiar. Quando apoiados por políticas e programas favoráveis, os agricultores familiares têm uma capacidade única de reverter as falhas de um sistema alimentar global que, embora produza alimentos suficientes para todos, desperdiça um terço dos alimentos produzidos, não fornece alimentos nutritivos suficientes para dietas saudáveis e acessíveis, falha em reduzir a fome e gera desigualdades sociais.”
Para finalizar, gostaria de dizer que a aprovação pelo Conselho Mundial de Segurança Alimentar (CFS) da Segunda Conferência Mundial de Reforma Agrária e Desenvolvimento Rural, a ser realizada na Colômbia no início de 2026, fornece uma oportunidade ímpar de se elaborar uma proposta de revitalização da produção familiar para preencher a falta de frutas, verduras e legumes em todo o mundo – e, assim, permitir o acesso a uma alimentação mais saudável a todos, garantindo ao mesmo tempo uma distribuição da propriedade menos desigual do que a que temos atualmente.
O acesso mais equitativo à terra é uma condição sine qua non para o empoderamento dos agricultores familiares. A agricultura familiar desempenha um papel central na garantia da segurança alimentar das famílias e no fortalecimento da resiliência dos sistemas alimentares frente às mudanças climáticas. Além disso, práticas agrícolas tradicionais estão evoluindo para sistemas adaptados ao contexto local e resilientes ao clima, como a própria agricultura familiar, hortas domiciliares e a agricultura urbana. Esses modelos não apenas promovem a sustentabilidade ambiental, mas também criam oportunidades econômicas e sociais para comunidades vulneráveis.
Para isso, não resta dúvida de que a agricultura familiar é uma opção 100%!
José Graziano da Silva é diretor do Instituto Fome Zero e professor emérito da UNICAMP
Baixe aqui o artigo “Agricultura familiar: uma opção cem por cento“, em Português
Descargue aquí el artículo “Agricultura familiar, una opción cien por cien“, en Español
Download the article “Family farming, a one hundred percent option” here, in English
Bibliografia
• Banco Mundial. World Bank Report, 2016.
• Del Grossi, M. Agricultura familiar nos censos agropecuários, 2020.
• Dion, J. et al. “Future of Small Farms and Agro-Food Systems,” 2023
• FAO. The State of Food and Agriculture, 2014.
• FAO e IFAD. Plano de Ação Global da Década da Agricultura Familiar da ONU (2019–2028), 2019.
• Giller, K. E. e Andersson, J. “Smallholder Adaptation and Transformation,” 2024.
• Herrero, M. et al. “Small Farms and Biodiversity,” 2017.
• HLPE. High Level Panel of Experts Report on Small Farms, 2013.
• Hoffmann, R. Agricultura familiar produz 70% dos alimentos consumidos no Brasil? 2015.
• Lowder, S. K., Sánchez, M. V., e Bertini, R. “The World’s Family Farms,” 2021.
• Ricciardi, V. et al. “Contribution of Small Farms to Global Food Supply,” 2018.
• Ricciardi, V. et al. “Small Farms, Diversity, and Food Systems,” 2021.
• Rigg, J., Salamanca, A., e Thompson, E. “Land and Rural Livelihoods,” 2016.