IFZ | 16/12/2024
Circula nas redes sociais um maldoso corte em vídeo de uma apresentação do professor José Graziano da Silva, que não representa nem a opinião do IFZ nem a dele. O trecho, fora de contexto, dá a entender que os números sobre a agricultura familiar foram simplesmente inventados, quando, na verdade, o professor explicava que ficar apegado ao percentual de 70% para qualificar a contribuição da agricultura familiar, reforça a visão “produtivista” que procura reduzir a importância desse tipo de agricultura para o meio ambiente e a melhoria da distribuição da renda e da propriedade no campo.
Quem assiste ao vídeo completo percebe que, a partir do minuto 34, Graziano explica que, no início dos anos 2000, havia poucos dados disponíveis exceto os do censo de 1970. Na época, para não ficar repetindo os percentuais da contribuição de cada produto individualmente,resolveu-se dizer que a agricultura familiar era responsável por 70% da produção de alimentos, porcentagem essa que era uma especie de “media” dos valores disponíveis.
Em seguida, no mesmo vídeo, o professor Graziano reforça que é preciso “virar o disco, atualizar um pouco as informações”. Ele ressalta: “a agricultura familiar tem um papel fundamental. Primeiro, na distribuição da renda. Uma região que tem agricultura familiar tem uma distribuição de renda muito melhor do que uma região de grandes propriedades. Segundo, tem uma preservação do meio ambiente, por não ter monoculturas de grandes extensões, completamente diferente de preservação do bioma, da diversidade, etc. Ou seja, há outros valores na agricultura familiar além da contribuição para a produção alimentícia”.
Graziano lembra ainda que disponibilizou no site do IFZ um artigo onde reforça que a agricultura familiar é uma opção 100%. O texto (https://ifz.org.br/agricultura-familiar-uma-opcao-cem-por-cento/), publicado em novembro, deixa clara a defesa de que os “agricultores familiares não fazem parte apenas do ‘problema’ da pobreza rural; na verdade, eles podem ser também parte da solução para a segurança alimentar e o desenvolvimento sustentável, se apoiados por políticas públicas”.
No artigo, ele cita ainda os cuidadosos trabalhos de Mauro Delgrossi, mostrando que, apesar de uma pequena redução no número e na área total ocupada pela categoria, sua participação no valor da produção reduziu-se acentuadamente, caindo de 35% para 23% entre os censos agropecuários de 2006 e 2017.
Gráfico 1: Participação da Agricultura Familiar (%) nas lavouras temporárias, Brasil, 2006 e 2017
Fonte: Dados públicos consolidados pelo Dr. Mauro Delgrossi
“Essa queda acentuada reflete uma drástica redução na participação de culturas alimentares básicas, como o arroz, que caiu de 34% para 11% entre 2006 e 2017; do feijão (todas as variedades), que passou de 72% para 23%; do milho, de 46% para 12%. Quedas menores, mas também importantes, ocorreram no valor da produção da agricultura familiar na mandioca, que caiu de 85% para 70%, e até mesmo na horticultura, que caiu de 65% para 60% entre 2006 e 2017. A julgar pelas informações disponíveis sobre a expansão do agronegócio nos últimos anos, essa queda da produção da agricultura familiar deve ter se acentuado ainda mais na presente década”.
O texto finaliza reforçando que a agricultura familiar desempenha um papel central na garantia da segurança alimentar das famílias e no fortalecimento da resiliência dos sistemas alimentares frente às mudanças climáticas. “Além disso, práticas agrícolas tradicionais estão evoluindo para sistemas adaptados ao contexto local e resilientes ao clima, como a própria agricultura familiar, hortas domiciliares e a agricultura urbana. Esses modelos não apenas promovem a sustentabilidade ambiental, mas também criam oportunidades econômicas e sociais para comunidades vulneráveis”.
Sugerimos, ainda, a leitura do artigo “Agricultura familiar: uma opção cem por cento“, escrito pelo Prof. Graziano e publicado em novembro
Quem tiver interesse no tema pode se informar no site e nas redes sociais do IFZ.