Obesidade infantil exige políticas de incentivo à alimentação saudável

Incidência de sobrepeso entre crianças no Brasil chega ao triplo da média global, revela estudo

Editorial do O Globo | 17/12/2023

A obesidade entre crianças e adolescentes se torna a cada dia mais preocupante. Um a cada três brasileiros de 10 a 18 anos tinha excesso de peso em 2022, revelou levantamento do Observatório de Saúde na Infância, da Fiocruz, com base em dados do Ministério da Saúde (entre crianças de até 5 anos, uma em cada dez). Entre 2019 e 2021, as crianças com excesso de peso aumentaram 6,1% e os adolescentes 17,2%. A alta é atribuída aos longos e tenebrosos períodos de isolamento social e às mudanças na rotina, com redução nos exercícios físicos. Depois os números caíram, mas permanecem altos. A parcela de crianças com sobrepeso ou obesidade (14,2%) é quase o triplo da média global (5,6%). A de adolescentes (31,2%), quase o dobro (18,2%).

Embora o excesso de peso, especialmente na infância, possa estar ligado a influências familiares, não é questão exclusivamente privada, em razão dos efeitos na saúde pública. Cedo ou tarde ele desaguará nos ambulatórios e enfermarias do SUS, na forma de doenças que poderiam ter sido tratadas ou controladas por meio de alimentação mais saudável. Por isso o Estado não pode se omitir na formulação de políticas para melhorar os hábitos alimentares da população e para estimular a prática de exercício físico.

Há boas iniciativas em curso, mas ainda em pequena escala. Uma delas é a nova rotulagem dos alimentos ultraprocessados. Em outubro do ano passado, entraram em vigor as novas normas para rótulos de alimentos e bebidas no país. Fabricantes têm de informar de forma legível na embalagem se o produto contém alto teor de açúcar, sódio ou gordura saturada. A escolha sempre caberá ao consumidor, mas ele decidirá com base em informações claras, que não ficam ocultas sob letras miúdas. Pena que as regras — similares às que vigoram noutros países — ainda alcancem por aqui poucos produtos, pois têm sido implantadas gradualmente.

Outra iniciativa importante são as leis que restringem oferta e venda de alimentos processados em estabelecimentos públicos e privados de ensino. A medida é adotada em alguns estados e cidades do país. No município do Rio, os ultraprocessados foram banidos em julho, depois de discussões na Câmara em que prevaleceu o bom senso. A ideia não sensibilizou o estado, e a Assembleia Legislativa do Rio rejeitou proposta semelhante. A escola é o ambiente ideal para conscientizar as crianças sobre a importância de uma alimentação menos nociva e para criar o hábito da prática esportiva.

Não é fácil mudar hábitos, principalmente quando o consumidor tem à disposição uma oferta abundante de guloseimas. Alimentos com alto teor de açúcar, sódio e gordura saturada ocupam posições estratégicas nas gôndolas dos supermercados. Muitas vezes, custam menos que os alimentos naturais. O Estado, a quem caberá o custo da má alimentação no longo prazo, precisa criar políticas públicas para incentivar os hábitos saudáveis e dar aos cidadãos as informações necessárias para que ele possa fazer suas escolhas.

Publicado no O Globo
https://oglobo.globo.com/opiniao/editorial/coluna/2023/12/obesidade-infantil-exige-politicas-de-incentivo-a-alimentacao-saudavel.ghtml