Os impactos dos alimentos mais consumidos no Brasil para a saúde e o meio ambiente

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Blog do IFZ | 11/05/2025

Baixe aqui o estudo “Health and Environmental Impacts of Major Foods Consumed in Regional Food Systems of Brazil

Um prato de arroz com feijão pode acrescentar minutos à sua vida, enquanto um biscoito recheado pode tirá-los. Essa é a lógica por trás de um estudo pioneiro realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e do Instituto Técnico da Dinamarca (DTU). Publicada em maio de 2025 no International Journal of Environmental Research and Public Health, a pesquisa aplicou pela primeira vez no Brasil o Health Nutritional Index (HENI), uma métrica que estima o ganho ou a perda de minutos de vida saudável com base nos alimentos consumidos diariamente — levando em conta também seus impactos ambientais.

Foram analisados 1.141 alimentos presentes na dieta nacional, cruzando dados nutricionais, de saúde pública e de sustentabilidade. O levantamento escancara como nossas escolhas alimentares afetam não só o bem-estar individual, mas também o planeta, e propõe um instrumento inovador que pode orientar políticas públicas e escolhas mais conscientes.

O que é o HENI?

O HENI (Health Nutritional Index) é um índice que transforma em minutos de vida saudável o efeito do consumo de porções alimentares, a partir de dados da carga global de doenças (Global Burden of Disease – GBD). O índice foi originalmente desenvolvido nos Estados Unidos e adaptado no estudo para a realidade brasileira.

Alimentos que contribuem positivamente para a saúde — como frutas, peixes e legumes — adicionam minutos de vida. Já aqueles associados ao aumento de doenças crônicas — como carnes processadas, refrigerantes e biscoitos — subtraem tempo de vida saudável. O cálculo leva em conta 15 fatores de risco dietético, e cada alimento recebe uma pontuação proporcional à sua composição e ao seu impacto na saúde da população brasileira.

No Brasil, a média dos alimentos analisados resultou em uma perda de 5,89 minutos de vida saudável por item consumido. Entre os piores colocados estão os biscoitos recheados (−39,69 min), carne suína (−36,09 min) e margarina (−24,76 min). Já entre os melhores, destacam-se o peixe de água doce (+17,22 min), a banana (+8,08 min) e o feijão (+6,53 min).

O peso ambiental da dieta brasileira

Além dos efeitos sobre a saúde, a pesquisa mediu o impacto ambiental dos alimentos com base em dois indicadores: emissão de gases de efeito estufa (em kg de CO₂ equivalente) e consumo de água (em litros). Os resultados revelam que produtos de origem animal têm os maiores custos ambientais. Um único prato com carne bovina pode emitir até 21,3 kg de CO₂ e consumir mais de 70 litros de água. A pizza de mussarela chega a demandar 306 litros por porção.

A carne bovina é, disparadamente, o item mais impactante: responde por 86% da pegada de carbono da dieta, 90% do uso de terras e 77% da eutrofização. Em contraste, alimentos vegetais como feijão e banana têm impacto quase nulo — e ainda contribuem positivamente para a saúde.

Saúde, sustentabilidade e desigualdades regionais

O estudo também analisou os padrões alimentares em quatro grandes sistemas alimentares regionais do país: o Cinturão Agrícola (Centro-Oeste e Norte), o Centro Econômico (Sudeste e Sul), o Eixo de Desenvolvimento Latente (Nordeste) e a Fronteira da Vulnerabilidade (Amazônia Legal). Apesar de os alimentos mais consumidos serem semelhantes entre regiões — arroz, feijão e carne estão no topo —, há diferenças relevantes, como a presença marcante de açaí com granola (+41,43 min) na região Norte.

O HENI mostrou-se amplamente negativo nas quatro regiões, sobretudo em função do consumo elevado de carnes e alimentos ultraprocessados. Margarina, biscoitos salgados, pizzas e refrigerantes estão entre os itens mais prejudiciais à saúde e mais frequentes nas dietas, especialmente no Centro Econômico e no Cinturão Agrícola.

No entanto, o estudo também evidencia a biodiversidade alimentar brasileira e o potencial dos alimentos regionais. O consumo de feijão, banana, mandioca, peixes e pratos típicos como o baião de dois mostra-se vantajoso tanto em termos de saúde quanto de sustentabilidade — o que reforça a importância de políticas que valorizem a agricultura familiar e a cultura alimentar local.

Políticas públicas e caminhos possíveis

Ao quantificar em minutos de vida e litros de água os impactos das nossas escolhas alimentares, o estudo propõe uma base objetiva para políticas públicas. Os autores defendem a incorporação de critérios de saúde e sustentabilidade nos guias alimentares oficiais, compras institucionais, campanhas educativas e rotulagem nutricional.

A experiência internacional com selos como o Nutri-Score, na Europa, é citada como exemplo de como índices integrados podem orientar o consumidor de forma clara e acessível. A versão brasileira do HENI, ao incluir dados de doenças e hábitos alimentares nacionais, representa um passo concreto na construção de políticas alimentares mais alinhadas à realidade do país.

A pesquisa escancara a urgência de reavaliarmos o que colocamos no prato. Mesmo alimentos in natura como carnes podem ter altos custos ambientais e sanitários, enquanto itens simples como feijão e banana podem ser grandes aliados da saúde pública e da sustentabilidade.

Promover o consumo de alimentos saudáveis e sustentáveis exige mais do que escolhas individuais: requer um conjunto articulado de políticas públicas, acesso equitativo a alimentos de qualidade, valorização da agricultura familiar e enfrentamento das desigualdades sociais. Afinal, cada garfada carrega consigo não apenas sabor, mas tempo de vida — e o destino do planeta.

Baixe aqui o estudo “Health and Environmental Impacts of Major Foods Consumed in Regional Food Systems of Brazil