Relatório do Programa Antártico Brasileiro aponta recorde histórico de degelo nas regiões polares

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Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) | 31/01/2025

O derretimento do gelo no Ártico e na Antártica pode gerar consequências graves para o clima mundial
O derretimento do gelo no Ártico e na Antártica pode gerar consequências graves para o clima mundial

A Antártica registrou, em 2023, a menor cobertura de gelo marinho desde 1979, ano em que se começou a fazer esse tipo de mensuração. Os dados estão no  relatório publicado neste mês pelo Com-ANTAR, projeto vinculado ao Programa Antártico Brasileiro (Proantar). O documento aponta situação semelhante no Ártico: a região teve seus recordes históricos de degelo marinho em 2012 e 2020, seguidos agora pelos anos de 2023 e 2024. De acordo com o documento, em 2024, não se formaram 3.408.000 km² de gelo marinho globalmente, o equivalente a 37% do território dos Estados Unidos.

Assinam o estudo o pesquisador em Ciências do Mar, bolsista de Produtividade em Pesquisa do  Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Ronaldo Christofoletti, e o bolsista de Pós-Doutorado Júnior do CNPq, André Pardal. Segundo os pesquisadores, as alterações climáticas resultantes do derretimento do gelo marinho trazem consequências como o aumento na frequência e na intensidade de desastres ambientais, incluindo ondas de calor, incêndios florestais, secas e inundações.

“O degelo marinho recorde, assim como o fato de 2024 ser o ano mais quente da história, reforça os alertas sobre os impactos das mudanças ambientais, como as enchentes no Rio Grande do Sul, em 2024, e as crescentes erosões costeiras e tempestades em várias regiões”, explica Christofoletti, coordenador do relatório. Segundo ele, o degelo marinho também contribui para a desregulação do ciclo hídrico, que influencia a produtividade agrícola e a economia nacional.

O estudo comparou os últimos dois anos (2023 e 2024) com o período de referência de 1981 a 2010, com base em informações em fornecidas pelo Centro Nacional de Dados de Neve e Gelo (National Snow and Ice Data Center – NSIDC), da Universidade estadunidense do Colorado. Os dados utilizados foram gerados a partir de imagens de satélite, também fornecidas pelo NSIDC e pela Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (National Oceanic and Atmospheric Administration – NOAA), dos Estados Unidos. Essas informações seguem metodologia padronizada que monitora, de forma diária, desde 1979, a extensão das áreas oceânicas com ao menos 15% de gelo marinho. Os dados não consideram o degelo em regiões terrestres.

Degelo: problema comum ao Ártico e à Antártica

O relatório encabeçado pelos bolsistas do CNPq mostra que na Antártica, em 2023, mais especificamente no mês de fevereiro, foi registrada a menor cobertura de gelo marinho: 1,79 milhões de km². O valor é 1,10 milhões de km²  menor que a média dos valores utilizados no período referência (1981-2010) e equivale a duas vezes o estado da Bahia. O relatório mostra que o ano seguinte, 2024, foi um pouco melhor: a cobertura de gelo mínima anual naquele ano foi de 1,99 milhões de km², observada em fevereiro. A área pode ser comparada ao território da região Sudeste brasileira ou ao território da França somado ao da Alemanha e é 898 mil quilômetros quadrados menor do que a média dos valores mínimos anuais de cobertura do gelo marinho para o período de 1981 a 2010.

No ártico, a cobertura anual mínima de gelo marinho foi registrada em setembro de 2024. Com valor de 4,28 milhões de km², ela é quase 2 milhões de quilômetros quadrados menor do que a média dos valores mínimos anuais de cobertura de gelo do período de 1981 a 2010 e equivale a uma área maior do que os territórios da Grécia, da Suécia, de Portugal, da Noruega, da Polônia, da Itália e do Reino Unido somados. A máxima anual de gelo no Ártico ocorreu em fevereiro de 2024, ao longo de 15 milhões de quilômetros quadrados. O valor é 505 mil quilômetros quadrados menor do que a média dos valores máximos anuais de cobertura de gelo marinho registrada entre 1981 e 2010.

Embora o Ártico e a Antártica sejam regiões polares cruciais para o equilíbrio climático do planeta, as duas áreas apresentam diferenças significativas. Enquanto o Ártico, no Hemisfério Norte, é dominado por gelo marinho flutuante, a Antártica é uma vasta massa de terra, que possui cerca de 70% da água doce do planeta armazenada em suas geleiras.

Primeiro dia sem gelo se aproxima

O primeiro dia sem gelo no Ártico pode acontecer até 2050, segundo os pesquisadores
O primeiro dia sem gelo no Ártico pode acontecer até 2050, segundo os pesquisadores

De acordo com o relatório, o degelo marinho na região do Ártico tem impactos maiores no aquecimento global porque lá a radiação solar é refletida pelo gelo marinho, o que auxilia a manutenção das temperaturas mais baixas. Quando o gelo derrete, a superfície escura do oceano absorve mais calor, intensificando o aquecimento global. O estudo aponta que o Ártico se aproxima de ter o primeiro dia sem gelo marinho, marco preocupante quando se trata do clima. Esse fenômeno deve ocorrer nas próximas décadas, possivelmente antes de 2050. Algumas projeções falam na década de 2030.

Sobre o  Com-ANTAR

O projeto Com-ANTAR é parte do Programa Antártico Brasileiro (Proantar). Liderado pela Unifesp, a intenção é levar os resultados do Proantar para a sociedade, por meio de ações com escolas, contato com jornalistas e tomadores de decisões. “O Proantar desempenha um papel essencial, ao contribuir para o avanço da ciência climática e oferecer conhecimento estratégico para a adaptação climática no Brasil, minimizando os impactos à sociedade”, diz o professor Christofoletti. No momento, o projeto participa da 43º Operação Antártica do Proantar.

Outas iniciativas de pesquisa sobre o degelo antártico

Trajeto da expedição liderada por pesquisadores da UFRGS à Antártica
Trajeto da expedição liderada por pesquisadores da UFRGS à Antártica

O degelo marinho e suas consequências também têm sido objeto de estudo de outros pesquisadores brasileiros, como os que participaram da Expedição Internacional de Circum-navegação Costeira Antártica, maior travessia polar com foco em pesquisa científica já realizada. A expedição, que partiu no final de 2024 do porto do Rio Grande, Rio Grande do Sul, com duração de 60 dias, tem previsão de conclusão em 30 de janeiro de 2025, quando o navio quebra-gelo russo Akademik Tryoshnikov retornar ao ponto de partida.  O projeto reuniu 57 cientistas de 7 países e foi liderado por pesquisadores brasileiros da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), gerando avanços considerados significativos no entendimento das mudanças climáticas. Além disso, reforçou o protagonismo do Brasil com pesquisa em condições extremas.

Publicado originalmente pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
https://www.gov.br/cnpq/pt-br/assuntos/noticias/destaque-em-cti/relatorio-de-projeto-ligado-ao-proantar-alerta-para-as-implicacoes-globais-do-degelo-marinho-registrado-no-artico-e-na-antartica