Por José Giacomo Baccarin e Gustavo Jun Yakushiji | 17/07/2025
INTRODUÇÃO
Baixe aqui o estudo “Variações Recentes e de Longo Prazo nos Preços dos Alimentos no Brasil – Análise de Julho de 2025“
Consideram-se dois movimentos nos preços dos alimentos ao consumidor, um deles entre os meses de determinado ano. Devido à sazonalidade de produção agrícola, é comum verificar flutuações em seus preços no mesmo ano, que tendem a aumentar nos meses de entressafra. Isto é muito comum para produtos perecíveis, cultivados ou criados em condições não controladas com estufas, galpões etc. e sem comércio internacional significativo.
No outro movimento, entre os anos, tem-se observado que, desde 2007, os alimentos no Brasil têm ficado relativamente mais caros que os outros bens de consumo, caracterizando-se a chamada inflação de alimentos. Nos dezoito anos de 2007 e 2024, em apenas quatro, 2009, 2017, 2021 e 2023, o Índice de Preços da Alimentação e Bebidas (IPAB) foi menor que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ocorrendo o contrário nos demais 14 anos (IBGE, 2025). A tendência observada no Brasil guarda correspondência com o que vem se verificando com os preços dos alimentos em nível internacional (FAO, 2025). Julga-se conveniente destacar o período da pandemia da Covid 19, de 2020 a 2022, em que o constatou-se um acirramento da inflação de alimentos.
Neste boletim, para o período janeiro de 2022 a junho de 2025, é feita uma comparação entre a variação do IPCA e do IPAB e entre o IPAD (Índice de Preços da Alimentação no Domicílio) e o IPAF (Índice de Preços da Alimentação Fora do Domicílio). Adicionalmente, verifica-se como os preços dos itens da Alimentação no Domicílio variaram nos primeiros seis meses de 2025. Tomando por base o último ano da pandemia da Covid 19, quer-se analisar alguns aspectos recentes da variação dos preços dos alimentos.
Outrossim, para um período maior, de 2007 a 2024, faz-se uma análise do que ocorreu com os preços dos alimentos fontes de proteínas animais, das seguintes cadeias agroalimentares: bovinocultura de corte, bovinocultura de leite, avicultura de corte, avicultura de postura e suinocultura. Associa-se a variação de preços ao consumidor com a disponibilidade interna dessas cadeias.
Usam-se informações do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), relativas ao IPCA e seus componentes, grupos, subgrupos, itens e subitens. Um dos nove grupos do IPCA é o de Alimentação e Bebidas, do qual deriva o IPAB (Índice de Preços de Alimentação e Bebidas). Este é subdividido em dois subgrupos, Alimentação no Domicílio, que resulta no IPAD, e Alimentação Fora do Domicílio, do IPAF. O IPAD é composto por 16 itens e por 159 subitens, enquanto o IPAF é composto apenas por subitens, em número de nove (IBGE, 2025).
Usa-se um conceito simples de disponibilidade interna resultado da soma da produção nacional mais importação e subtração da exportação, não considerando a variação de estoques e as perdas. A fonte de dados de produção são publicações do IBGE e de exportação e importação do MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços). Diante da indisponibilidade da alguns dados para 2024, a análise desse ponto restringiu-se ao período 2007 a 2023.
VARIAÇÕES RECENTES DOS PREÇOS DOS ALIMENTOS AO CONSUMIDOR
Na Figura 1 percebe-se que as flutuações no IPAB são mais intensas que no IPCA. Também se percebe um padrão de flutuação do IPAB em determinado ano, com os preços se elevando nos meses mais quentes e chuvosos, em que a produção de frutas, legumes e verduras é menor. Em 2022, isto não fica tão nítido, porque houve um movimento adicional, de redução dos preços dos anos da Covid 19 para os anos posteriores, a partir do segundo semestre de 2022. Repare-se que os maiores valores do IPAB ocorreram, justamente, em março e abril de 2022.
Na Tabela 1 evidencia-se que no período todo e em cada um dos anos, com exceção de 2023, o IPAB foi maior que o IPCA, com os alimentos pressionando para cima os preços ao consumidor. A exceção de 2023 está relacionada com a diminuição dos preços dos alimentos entre 2022 e 2023, após ter-se atingido o pico em março de 2022.
Nos primeiros seis meses de 2024, a média mensal de crescimento do IPCA foi de 0,41%, menos do que observado em 2025, de 0,49%. No caso do IPAB, esses números foram, respectivamente, 0,77% e 0,61%. Ou seja, em 2025, os alimentos têm pressionado menos a inflação ao consumidor no Brasil do que em 2024. Mas ainda mantêm uma média mensal em 2025 acima da constatada em todo o período 2022 a 2025.
Os valores do desvio padrão e do coeficiente de variação do IPAB mostram-se maiores que os do IPCA, confirmando que as flutuações nos preços dos alimentos são mais intensas que as do conjunto dos preços ao consumidor.


Preços dos Alimentos No e Fora do Domicílio
Ainda na Tabela 1, percebe-se que o IPAD registrou média mensal maior que o IPAF, em todo o período considerado. Percebe-se também, através dos valores de desvio padrão e coeficiente de variação e pela Figura 2, que as flutuações nos preços dos alimentos no domicílio são muito mais amplas do que as da alimentação fora do domicílio. Esta é menos afetada pelas flutuações dos preços das matérias primas agrícolas do que a alimentação no domicílio. Nos custos da alimentação fora do domicílio há grande participação de preços menos instáveis, ao longo do ano, como os dos aluguéis e dos salários, além de se trabalhar, provavelmente, com margens de comercialização maiores do que as dos supermercados e outros equipamentos varejistas. Isto possibilita a maior diluição/absorção da variação dos preços agrícolas nos preços da alimentação em bares, lanchonetes e restaurantes.

Diferentemente do IPAD, em 2023, o IPAF registrou valor maior que o IPCA. Isto é explicado por questões ligadas à demanda. Em 2022, ainda havia restrições ao consumo fora de casa, superadas a partir de 2023, possibilitando aos estabelecimentos fornecedores de refeição reajustarem seus preços. Nos anos seguintes, a elevação do IPAF continuou ocorrendo, em decorrência do crescimento do nível de ocupação e da renda das famílias nos últimos anos.
Fontes do Encarecimento dos Alimentos no Domicílio em 2025
A Tabela 2 apresenta a importância na alimentação no domicílio dos 16 itens considerados pelo IBGE, com as suas variações de preços e contribuição para o IPAD, nos primeiros seis meses de 2025. Carnes (bovina e suína, basicamente), leite e derivados, panificados, bebidas e infusões e aves e ovos são os cinco principais itens, representando 63,0% do consumo de alimentos no domicílio.
Cinco itens registraram queda de preços, com destaque ao item cereais, leguminosas e oleaginosas, cuja redução foi de 12,8%, devido às quedas observadas nos preços dos subitens arroz (14,5%) e feijão preto (24,5%), enquanto o feijão carioca apresentava um aumento pequeno, de 1,0%. No item carnes, houve diminuição nos preços da carne bovina e na suína.
Enquanto nove itens registravam variação de preços abaixo dos 3,73% do IPAD, sete registraram variação acima. O maior aumento foi no item tubérculos, raízes e legumes, de 25,8%, sob grande influência da elevação do preço do subitem tomate, de 56,0%, e do subitem cebola, de 26,8%. No item bebidas e infusões, que registrou o segundo maior aumento, quase toda a pressão do aumento de preços veio do subitem café moído, cujos preços cresceram 42,9%. Em aves e ovos, os três subitens aumentaram de preços, frango inteiro, 4,0%, frango em pedaços, 6,8% e, especialmente, ovos, com elevação de 16,6%. É bom que se diga, que este aumento se deveu ao ocorrido no primeiro trimestre do ano, com os preços dos ovos diminuindo em abril, maio e junho.

Levando em conta a importância de cada item no consumo no domicílio, no primeiro semestre de 2025, a maior contribuição para o IPAD, de 43,3%, veio do item bebidas e infusões, seguida de tubérculos, raízes e legumes, com 26,6%. A soma desses dois itens resulta, praticamente, em 70%, apontando grande concentração de pressões altistas nos preços dos alimentos no domicílio.
PREÇOS DAS PROTEÍNAS ANIMAIS
A Tabela 3 mostra que tanto no subperíodo 2007-19, quanto no de 2020-22, os alimentos pressionaram a inflação ao consumidor no Brasil. Na fase da pandemia isto foi mais acirrado, com o IPAD registrando valor 2,1 vezes maior que o IPCA, contra 1,4 vez no subperíodo anterior. O fato dos alimentos subirem menos que o IPCA em 2023-24 não indica, necessariamente, o início de uma nova tendência. Em 2023, os preços dos alimentos tenderam a cair ou crescer pouco, como ajuste à grande elevação na fase da Covid 19, fato que não se repetiu em 2024, quando os preços dos alimentos voltaram a pressionar o IPCA. No período todo, de 2007 a 2024, o IPAD registrou valor 64,9% acima do IPCA e o IPAB, 69,0%.

Na bovinocultura de corte foi onde se verificou o maior aumento de preços, 2,9 vezes maior que o IPCA. Tal pressão altista tendeu a se concentrar no período 2007-19 e se amenizou nos períodos mais recentes. Nas outras duas cadeias fornecedoras de carne, a elevação de preços foi bem menos significativa, abaixo do IPAB e do IPAD e, no caso da suinocultura, muito próxima à do IPCA.
As três cadeias destinam parcela importante de sua produção para exportação, 35,0% na avicultura de corte, 19,2% na bovinocultura de corte e 18,9% na suinocultura, na média de 2007 a 2023. A Figura 3 mostra que a disponibilidade interna das três cadeias aumentou no período considerado, muito pouco na bovinocultura de corte (19,9%, entre 2007 e 2023) e de forma muito expressiva na avicultura de corte (83,2%) e, especialmente, na suinocultura (117,6%). É provável que este seja um dos motivos para os preços da carne bovina ter crescido de forma mais acentuada que os das carnes de frango e suína.

Na avicultura de postura, o comércio exterior é insignificante, com importação, inexistente, praticamente, e com exportação representando menos que 1% da produção nacional, na média de 2007 a 2023. Neste caso, foi observado o segundo maior aumento de preços entre as cadeias consideradas, com elevação de 316,3% no preço do ovo de galinha.
Como mostra a Figura 4, a disponibilidade da avicultura de postura cresceu 67,7%, de 2007 a 2023. Tal desempenho não evitou forte crescimento no preço do ovo, talvez devido a dois fatores de demanda, o ovo voltou a ser valorizados pelos consumidores, que antes o enxergavam como prejudicial à saúde. O segundo fato é que o grande aumento do preço da carne bovina acabou por elevar a procura por ovo de galinha, pressionando seu preço.

Na bovinocultura de leite, a exportação representou 1,1% e a importação 3,2% da produção nacional da cadeia, na média de 2007 a 2023, revelando pequena importância do comércio exterior. Ao mesmo tempo, sua disponibilidade interna apresentou crescimento de 45,9%, conforme a Figura 3, o segundo pior desempenho entre as cadeias analisadas. Seus preços cresceram 201,7%, em todo o período, podendo-se destacar o forte aumento nos três anos da Covid 19.
Referências
BRASIL. ComexStat – Dados Gerais. Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços – MDIC, 2025b. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/ relacoes-internacionais/estatisticas-de-comercio-exterior. Acesso em: 19 fev. 2025.
FAO. FAO Food Price Index. World Food Situation, 2025. Disponível em: https://www.fao.org/worldfoodsituation/foodpricesindex/en/. Acesso em: 10 de jun. 2025.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Índice de Preços ao Consumidor Amplo. Sistema IBGE de Recuperação Automática – SIDRA, 2025a. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/home/ipca/brasil. Acesso em: 2025.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa da Pecuária Municipal. Sistema IBGE de Recuperação Automática – SIDRA, 2025b. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/ppm/tabelas/brasil/2023. Acesso em: 10 jun. 2025.
José Giacomo Baccarin é Professor Economia Rural e Política Agrícola UNESP, campus Jaboticabal (SP). Credenciado Pós-Graduação Geografia UNESP, campus Rio Claro (SP). Diretor Instituto Fome Zero. E-mail: [email protected]
Gustavo Jun Yakushiji é Engenheiro Agrônomo e Mestrando em Estatística e Experimentação Agronômica pela ESALQ/USP.
Baixe aqui o estudo “Variações Recentes e de Longo Prazo nos Preços dos Alimentos no Brasil – Análise de Julho de 2025“
