Por que precisamos de organizações fortes de agricultores para alcançar as grandes metas ambientais do mundo

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As organizações de agricultores em nível nacional são aliadas fundamentais na restauração florestal, na conservação e no combate à degradação da terra – seja por meio da capacitação, da mobilização de recursos internos ou da conexão entre produtores e mercados.

Insight de Isabela Núñez del Prado Nieto para o IIED | 01/09/2025

As metas globais de restaurar florestas, prevenir a degradação da terra e manejar ecossistemas de forma sustentável não terão êxito sem o envolvimento direto das organizações de produtores florestais e agrícolas (FFPOs, na sigla em inglês).

Essas organizações atuam em diferentes níveis: desde grupos locais de pequenos produtores, passando por associações ou federações de cooperativas, até chegar a entidades nacionais de representação ampla.

As chamadas FFPOs de cúpula (apex-level) funcionam como organizações nacionais ou regionais que reúnem redes de grupos menores, oferecendo representação, apoio, voz coletiva e acesso a serviços, mercados e processos de formulação de políticas. Por isso, são parceiras estratégicas para promover mudanças sistêmicas.

Programas ambientais de grande escala precisam envolver ativamente essas organizações para garantir que as ações sejam adequadas às realidades locais e sustentáveis no longo prazo.

O Programa de Impacto em Paisagens Sustentáveis de Terras Secas (DSL-IP), do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), busca evitar, reduzir e reverter a degradação, a desertificação e o desmatamento em áreas áridas, por meio do manejo sustentável de florestas e propriedades rurais. Como parceiro do Forest and Farm Facility, o IIED tem trabalhado para integrar as FFPOs de cúpula ao DSL-IP, aproximando as ambições globais da ação local.

Por que as organizações de cúpula são tão valiosas?

As FFPOs de cúpula vão além da representação formal de seus membros. Elas oferecem serviços essenciais, como acesso a financiamento, apoio à criação de cadeias de valor, capacitação em governança e articulação política.

Ao reunir as demandas e capacidades de diferentes grupos, conseguem ampliar práticas de uso sustentável da terra, facilitar o acesso a mercados e influenciar políticas nacionais.

Um exemplo notável é a Farmers Union of Malawi (FUM), criada em 2003. Atuando como entidade guarda-chuva de agricultores e organizações de agricultores, a FUM tem três focos principais: fortalecimento institucional, incidência política e desenvolvimento de agronegócios.

A FUM organiza produtores em grupos fortes e viáveis, promove sua capacidade de ação coletiva, cria espaços de diálogo e utiliza pesquisas baseadas em evidências para defender políticas públicas favoráveis à agricultura sustentável. Além disso, estabelece parcerias comerciais que fortalecem cadeias de valor e criam oportunidades para pequenos agricultores.

A FUM: fortalecendo e apoiando produtores locais

O IIED coordena a linha de ação do DSL-IP voltada ao desenvolvimento de cadeias de valor verdes em seis países: Angola, Botsuana, Malaui, Namíbia, Zimbábue e Tanzânia.

O trabalho começou em Malaui, em parceria com a FUM, para:

  • fortalecer a capacidade de grupos de agricultores locais;
  • conectá-los a serviços de extensão e mercados;
  • mobilizar financiamento interno e externo para apoiar cadeias de valor verdes.

No âmbito dessa cooperação, a FUM:

  • estruturou governança em nível distrital e ofereceu capacitação em temas como desenvolvimento de empreendimentos e gestão interna;
  • conectou agricultores ao sistema de extensão governamental de Malaui, garantindo sua voz em decisões sobre desenvolvimento rural;
  • apoiou cadeias de valor criando vínculos com compradores (off-takers) que adquirem colheitas antecipadamente, como nos contratos estabelecidos entre cooperativas agrícolas e escolas primárias com programas de alimentação;
  • facilitou o acesso a financiamento, tanto por meio da mobilização de poupança coletiva em associações locais de crédito e empréstimo, quanto no apoio à obtenção de subsídios e linhas de crédito governamentais.

FFPOs de cúpula: agentes críticos para mudanças duradouras

Muitos programas de restauração e combate à degradação da terra enfrentam dificuldades em chegar ao nível local ou em manter seus resultados após o fim dos financiamentos. Uma das razões é que frequentemente deixam de lado as organizações de agricultores, que estão em posição privilegiada para sustentar mudanças a longo prazo.

A experiência da FUM mostra o contrário. Atuando na interseção entre ação comunitária e formulação de políticas nacionais, ela está particularmente preparada para implementar programas ambientais de grande escala de forma inclusiva, sustentável e adaptada à realidade local.

O trabalho da FUM no DSL-IP ilustra como alinhar metas ambientais a cadeias de valor verdes pode gerar renda e incentivar práticas agrícolas sustentáveis. Por meio de suas redes, a FUM dissemina boas práticas, repassa treinamentos em agricultura, governança e gestão de empreendimentos, além de facilitar o acesso a mercados.

Isso permite que produtores aumentem sua renda e mantenham práticas produtivas sustentáveis. A mobilização de poupança interna e de financiamento externo garante viabilidade financeira às intervenções. E, ao enraizar as atividades em estruturas locais de governança, a apropriação comunitária e o alinhamento político são fortalecidos.

Para alcançar impacto ambiental de longo prazo, programas globais precisam envolver organizações de cúpula desde o início. O DSL-IP já mostra que isso é viável.

Outras iniciativas apoiadas pelo GEF, pelo Fundo Verde para o Clima e por mecanismos semelhantes deveriam seguir o mesmo caminho. Se queremos restaurar florestas e proteger nossas terras, o recado é claro: reconhecer e apoiar essas organizações como parceiras centrais em qualquer projeto ambiental.

Sobre a autora

Isabela Núñez del Prado Nieto ([email protected]) é pesquisadora do Grupo de Recursos Naturais do IIED – International Institute for Environment and Development (Instituto Internacional para o Meio Ambiente e Desenvolvimento)

Publicado originalmente pelo IIED
https://www.iied.org/why-we-need-strong-farmer-organisations-achieve-worlds-big-environmental-goals