Proteção Social e Ação Climática Inclusiva: Evidências do Fundo Verde para o Clima

  • Tempo de leitura:5 minutos de leitura

Blog do IFZ | 26/09/2025

Baixe aqui o estudo “Social protection and inclusive climate action: A review of social protection for rural populations within Green Climate Fund projects”

A nova revisão conduzida pela FAO, em parceria com o Fundo Verde para o Clima (GCF, na sigla em inglês), mostra que a proteção social é uma ferramenta poderosa, mas ainda subutilizada, para enfrentar os impactos da mudança climática de forma inclusiva, sobretudo nas áreas rurais. O estudo analisou 23 projetos financiados pelo GCF e trouxe evidências de como mecanismos como transferências de renda, programas de obras públicas e serviços complementares podem contribuir tanto para a adaptação quanto para a mitigação climática e para a transição justa.

A importância da proteção social no contexto climático

A proteção social tradicionalmente busca reduzir a pobreza, a desigualdade e a exclusão social ao longo do ciclo de vida, por meio de políticas como transferências monetárias, seguros e programas de capacitação. Quando integrada às metas climáticas, essa agenda adquire um papel adicional: fortalecer a resiliência de populações vulneráveis diante de choques climáticos, apoiar a adaptação de agricultores familiares e promover uma transição justa rumo a economias de baixo carbono.

Apesar desse potencial, apenas 0,8% do financiamento climático global chega atualmente aos sistemas agrícolas de pequena escala — justamente os mais vulneráveis. Além disso, eventos como enchentes e ondas de calor ampliam desigualdades: estudos citados no relatório mostram que esses choques aumentam em US$ 41 bilhões anuais a diferença de renda entre famílias pobres e não pobres, e em US$ 53 bilhões entre lares chefiados por mulheres em comparação aos de homens.

Os 23 projetos analisados

A revisão identificou 23 projetos do GCF com componentes de proteção social, distribuídos em quase todas as regiões do mundo, mas com maior concentração na África Subsaariana e na Ásia-Pacífico (oito projetos cada). Cinco projetos estavam em Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS), no Caribe e no Pacífico.

A maioria foi implementada em países de renda média-baixa (13) e média-alta (5), com apenas três em países de baixa renda: Uganda, Moçambique e Gâmbia. Essa distribuição revela uma lacuna preocupante: justamente os países mais pobres e vulneráveis são os que menos acessam financiamento climático integrado à proteção social.

Instrumentos utilizados

  • Assistência social: foi o mecanismo mais comum. Incluiu 10 programas de obras públicas, 6 transferências de renda (em alguns casos combinadas com práticas agrícolas resilientes) e 1 transferência em espécie.
  • Mercado de trabalho: quatro projetos ofereceram capacitação e treinamento, como no caso de Uganda, onde comunidades próximas a áreas úmidas receberam formação para atuar em turismo, saúde e construção.
  • Seguros sociais: não foram identificados projetos que utilizassem instrumentos contributivos de saúde ou pensão, um ponto cego importante do portfólio.

Muitos projetos buscaram apoiar a adaptação de longo prazo por meio da adoção de tecnologias agrícolas resilientes, diversificação de meios de vida e restauração de ecossistemas. Sete projetos responderam a choques rápidos, como enchentes, utilizando transferências emergenciais ou cupons. Outros cinco buscaram facilitar transições relacionadas à mitigação, como mudanças no uso da terra ou apoio a alternativas ao desmatamento.

Inclusão de gênero e grupos vulneráveis

Nenhum projeto foi considerado “transformador de gênero”, isto é, capaz de enfrentar de forma explícita normas sociais e relações de poder desiguais. Cinco projetos, entretanto, foram classificados como “responsivos ao gênero”, ao incluir metas claras para a participação das mulheres. O exemplo de Botsuana é ilustrativo: diante de barreiras para que mulheres se tornassem guardiãs ambientais (“ecorangers”), o projeto criou uma função alternativa de “trabalhadora de restauração”, mais acessível.

A maioria dos projetos adotou uma abordagem “sensível ao gênero”, ainda insuficiente para reduzir desigualdades estruturais. Apenas um projeto foi considerado fraco nesse aspecto.

Quanto a outros grupos, apenas seis projetos tinham ações direcionadas a pessoas com deficiência (26% do total), seis miravam a juventude e quatro incluíam povos indígenas. Nenhum projeto integrou de forma consistente migrantes ou refugiados em seus mecanismos de proteção social, apesar da relação evidente entre mudanças climáticas, pobreza rural e migração.

Fortalecimento sistêmico

Dez projetos tinham objetivos claros de fortalecimento de sistemas nacionais de proteção social. Isso incluiu tanto a incorporação de componentes adaptativos em programas existentes, como no Paraguai e em Moçambique, quanto a criação de novos mecanismos resilientes, como em Vanuatu e no projeto multilateral do Banco Asiático de Desenvolvimento. Já 13 projetos se limitaram a ações isoladas, sem maior integração sistêmica.

Mensagens para o futuro

O relatório conclui que os avanços são significativos, mas ainda marginais dentro do portfólio do GCF. Para ampliar o impacto, recomenda:

  • Escalar os investimentos em proteção social, tanto em número de projetos quanto em volume de recursos, com especial atenção a países de baixa renda e SIDS.
  • Fortalecer a inclusão, adotando abordagens mais ambiciosas em gênero e ampliando a atenção a migrantes, indígenas, pessoas com deficiência e jovens.
  • Investir em sistemas nacionais adaptativos, evitando intervenções pontuais e estimulando integração com políticas agrícolas, ambientais, de emprego e de gestão de riscos climáticos.
  • Promover colaborações globais, articulando governos, agências da ONU, bancos multilaterais e sociedade civil em plataformas como a Universal Social Protection 2030 e a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.

O estudo demonstra que a proteção social pode ser um elo decisivo entre justiça social e ação climática. Ao garantir que os recursos climáticos cheguem aos mais vulneráveis, ela se torna não apenas uma rede de segurança, mas também um motor de adaptação, mitigação e transição justa para sociedades mais resilientes.

Baixe aqui o estudo “Social protection and inclusive climate action: A review of social protection for rural populations within Green Climate Fund projects”