FAO alerta: pressão crescente sobre terra, solo e água ameaça produção de alimentos

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Blog do IFZ | 02/12/2025

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) lança uma nova edição do relatório “O Estado dos Recursos de Terra e Água para Alimentação e Agricultura” (“The State of the World’s Land and Water Resources for Food and Agriculture 2025”), documento que acende um alerta global sobre a crescente pressão que compromete os recursos que sustentam a produção de alimentos. Em um mundo que caminha para quase 10 bilhões de habitantes até 2050, a demanda por alimentos tende a crescer em ritmo acelerado, enquanto a base física que viabiliza essa produção — terra, solo e água — enfrenta um processo contínuo de degradação, esgotamento e competição entre setores.

O estudo destaca que mais de 60% da degradação induzida pelo ser humano ocorre justamente em áreas agrícolas, ao mesmo tempo em que a agricultura já consome mais de 70% de toda a água doce retirada do planeta. A combinação entre erosão do solo, redução da fertilidade, escassez hídrica e eventos climáticos extremos coloca em risco a capacidade de produzir alimentos de forma estável e segura, ampliando desigualdades e vulnerabilidades, especialmente em regiões mais pobres e dependentes da agricultura.

Ao mesmo tempo, a FAO mostra que ainda existe potencial para produzir mais e melhor — desde que os países adotem práticas sustentáveis, fechem lacunas de produtividade e promovam tecnologias capazes de restaurar a saúde do solo, otimizar o uso da água e aumentar a resiliência climática. O relatório apresenta caminhos técnicos e institucionais que podem transformar os sistemas agroalimentares, conciliando aumento de produção com redução de impactos ambientais.

Com essa publicação, a FAO convoca governos, instituições de pesquisa, produtores e sociedade civil a repensarem o modelo atual de uso dos recursos naturais. O futuro da alimentação depende das decisões tomadas agora. A recuperação de terras degradadas, o manejo eficiente da água e a gestão integrada de paisagens são passos essenciais para garantir melhor produção, melhor nutrição, melhor ambiente e melhor qualidade de vida — princípios centrais da agenda global da organização.

Panorama global: pressão crescente sobre terra, solo e água

Os recursos de terra, solo e água constituem a base da produção agrícola e da segurança alimentar global. Até 2050, a população mundial deve alcançar 9,7 bilhões de pessoas, o que exigirá que a agricultura produza cerca de 50% mais alimentos, rações e fibras do que em 2012. Essa expansão inevitavelmente aumentará a pressão sobre recursos que já se encontram em situação crítica: mais de 60% da degradação de terras provocada pelo ser humano ocorre justamente em áreas agrícolas — tanto lavouras quanto pastagens —, e a agricultura responde por mais de 70% de toda a água doce consumida no planeta.

Com 95% dos alimentos sendo produzidos em terra firme, a combinação entre degradação do solo, escassez de água e eventos climáticos extremos impõe desafios significativos aos sistemas agroalimentares, aos meios de vida rurais e à biodiversidade. A terceira edição do relatório examina como produzir mais — e melhor — ao mesmo tempo em que se protegem os recursos naturais finitos que sustentam a vida no planeta. O documento analisa o potencial das principais culturas hoje e em cenários futuros de mudança do clima e destaca práticas, tecnologias e políticas capazes de reduzir desigualdades produtivas de forma sustentável.

Os avanços obtidos nas últimas décadas, baseados sobretudo na intensificação agrícola, permitiram atender a uma demanda crescente por alimentos. Mas esses ganhos vieram acompanhados de impactos ambientais e sociais expressivos. Em várias regiões, a segurança alimentar e a resiliência dos sistemas produtivos já estão em risco. A boa notícia é que existem alternativas viáveis: práticas agrícolas sustentáveis podem restaurar terra, solo e água, além de gerar benefícios aos ecossistemas. A gestão integrada desses recursos também é essencial para mitigar e enfrentar os efeitos da crise climática.

Para atender à demanda futura, os ganhos não podem depender apenas de maior produção, mas de produção mais inteligente, com fechamento das lacunas de produtividade, diversificação de culturas resilientes e adoção de práticas eficientes em recursos e adequadas às condições de cada território. Não há solução única. O relatório reúne opções práticas de uso sustentável de terra, solo e água, exemplos de políticas bem-sucedidas e os principais fatores que permitem ampliá-las.

A FAO, por meio de seu quadro conceitual para gestão integrada de recursos de terra e água, apoia países na formulação de políticas, programas e ferramentas de gestão que assegurem o uso eficiente e produtivo desses recursos essenciais. A organização convida governos, instituições e sociedade a conhecerem a nova edição de “O Estado dos Recursos de Terra e Água” e a se engajarem na transformação dos sistemas agroalimentares em direção a sistemas mais resilientes e justos, sem deixar ninguém para trás. As escolhas feitas hoje — especialmente no manejo de terra e água — definirão a capacidade do mundo de alimentar as próximas gerações.

Mensagens Centrais do Documento

1. Desafios para os recursos de terra e água

  • Terra, solo e água são pilares da produção agrícola. A produtividade global cresceu nas últimas décadas, mas esse avanço teve custo ambiental e social elevado.
  • A degradação induzida pelo ser humano atinge lavouras, pastagens e florestas essenciais para a subsistência de milhões de pessoas. A agricultura intensiva e o uso insustentável de insumos químicos ampliam a contaminação e o esgotamento dos recursos naturais.

2. Situação atual e tendências

  • Entre 1964 e 2023, quase todo o aumento da produção agrícola mundial veio da intensificação. A expansão da área agrícola limitou-se a apenas 8%.
  • Mais de 1,66 bilhão de hectares — mais de 10% da superfície terrestre — já foram degradados por práticas inadequadas de uso e manejo da terra, sendo mais de 60% dessa degradação localizada em áreas agrícolas.
  • O desenvolvimento agrícola futuro precisa estar alinhado à transformação dos sistemas agroalimentares, conciliando melhoria de produção e nutrição com proteção ambiental e equidade social.

3. Produzir mais e melhor: potencial e limites

  • O mundo possui potencial para alimentar os 9,7 bilhões de habitantes previstos para 2050 e cerca de 10,3 bilhões quando a população atingir seu pico, por volta de 2085. No entanto, a expansão de áreas agrícolas é limitada e teria impacto direto sobre ecossistemas como florestas, pastagens e zonas úmidas.
  • Há espaço para expressivos ganhos de produtividade na maior parte das regiões em desenvolvimento e em diversas culturas, com ênfase no fechamento das lacunas de rendimento e na adoção de práticas sustentáveis adaptadas a cada contexto agroecológico.
  • As mudanças climáticas estão alterando a aptidão das terras para muitas culturas, deslocando áreas adequadas para altitudes e latitudes mais elevadas. Em vários cenários climáticos futuros, a demanda por água na agricultura aumenta enquanto a disponibilidade se torna mais variável e menos confiável.
  • Em regiões com escassez de terra e água, conciliar os interesses de agricultura, indústria, cidades, energia e conservação da biodiversidade implica decisões complexas. O planejamento integrado oferece ferramentas para gerir esses conflitos e otimizar o uso dos recursos.

4. Gestão sustentável: soluções técnicas

  • Há inúmeras soluções técnicas para promover o manejo sustentável da terra, do solo e da água. Sua eficácia depende das condições sociais, ecológicas e produtivas de cada região. Um ambiente institucional favorável é essencial para sua adoção.
  • A produtividade da agricultura de sequeiro pode aumentar com práticas como agricultura conservacionista, uso de variedades tolerantes à seca, conservação de umidade no solo, diversificação de culturas e compostagem orgânica. Essas técnicas fortalecem a segurança alimentar de pequenos produtores e melhoram a saúde do solo e a biodiversidade.
  • Abordagens integradas — como agrossilvicultura, pastoreio rotativo, melhoramento de forragens e sistemas combinados como o arroz-peixe — ampliam a resiliência climática, promovem sustentabilidade ambiental e adaptam o uso dos recursos às características de cada paisagem.

5. Ambiente favorável para soluções sustentáveis

  • Planejamento integrado do uso da terra, gestão de paisagens, manejo integrado de recursos hídricos, o nexo água-energia-alimentos-ecossistemas, agroecologia e abordagens sistêmicas são fundamentais para enfrentar as crises climática, hídrica e de biodiversidade. Não há solução única, e a coordenação entre setores é indispensável.
  • Para que soluções sustentáveis ganhem escala, é preciso garantir:
    • coerência de políticas entre setores;
    • governança ambiental eficaz;
    • sistemas robustos de dados, tecnologia e informação;
    • mecanismos de gestão de risco e alertas precoces;
    • financiamento e investimentos sustentáveis;
    • inovação;
    • formação e capacitação institucional.

Baixe aqui o documento completo “The State of the World’s Land and Water Resources for Food and Agriculture 2025

Baixe aqui o Resumo Executivo “In Brief to The State of The World’s Land and Water Resources for Food and Agriculture 2025” (em inglês) ou a “Versión Resumida de El Estado de los Recursos de Tierras y Aguas del Mundo para la Alimentación y la Agricultura 2025” (em espanhol)

Se preferir, leia o relatório no site da FAO
https://openknowledge.fao.org/server/api/core/bitstreams/889f7d6d-4d61-40eb-88f9-fddfc44bc817/content/cd7488en.html