Nota Pública
Preços dos alimentos no Brasil
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A questão do preço dos alimentos tem estado em evidência frente ao aumento vertiginoso de itens essenciais às populações. Essa não é uma questão nova e tampouco simples de se resolver ou mesmo de se diagnosticar. Não há solução milagrosa. O preço dos alimentos é algo multifatorial e se explica, sobretudo, por uma conjugação de fatores decorrentes das nossas opções políticas internas. Logo, buscar explicações restritas ao câmbio ou ao clima não é suficiente.
Mecanismos de mercado, como a retirada da tributação para importação de alimentos, são, sem dúvida, algo importante e que podem trazer algum resultado no curto prazo. Mas, com isso, baratearemos a importação justamente de produtos em que somos campeões de produção. Taxar a exportação dos produtos para aumentar a oferta interna talvez fosse mais interessante. Como se vê, as soluções não são simples e exigem tocar em interesses de poderosos. Por isso mesmo, a resposta mais eficiente a esse desafio exige que se encarem problemas de ordem estrutural e histórica. Vejamos:
O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, por meio da Conab, e os ministérios da Agricultura e da Fazenda, por meio de suas secretarias de política agrícola e política econômica, respectivamente, devem formular diretrizes e programas que tornem o abastecimento de produtos da cesta básica mais eficiente. Há experiência e técnicos bem preparados para tal. Isso tem que contemplar, em primeiro lugar, a questão dos estoques reguladores.
E isso é muito importante não apenas porque ajuda a controlar o preço, mexendo na disponibilidade de produtos ao mercado, mas também a garantir o próprio abastecimento em momentos de exceção, como bloqueio de estradas, enchentes, perda de safras, crises sanitárias, etc. Os estoques funcionam como mecanismo de proteção que pode ser utilizado para evitar situações graves de desabastecimento e de pressão de preços decorrentes dos efeitos das flutuações do câmbio, como ocorrido recentemente, ou de sinistros climáticos, como no caso da seca que afetou o café.
Em segundo lugar, é preciso garantir maior estímulo à produção de alimentos da cesta básica (alimentos in natura ou minimamente processados, conforme bem recomenda o Guia Alimentar para a População Brasileira). Isso significa linhas de crédito e assistência técnica voltadas aos pequenos produtores de forma mais massiva. Isso deve vir acompanhado do estímulo à produção nacional de insumos e equipamentos para pequenos produtores.
O Governo Federal deve estimular que prefeituras implantem projetos locais que criem ou revitalizem Equipamentos de Segurança Alimentar e Nutricional, tais como mercadões, feiras, sacolões e centrais de abastecimento, que aproximem consumidores e produtores regionalmente, proporcionando circuitos curtos de comercialização. Essa descentralização, além de valorizar os alimentos regionais, possibilita melhores preços, dado os menores custos de transporte e a possibilidade de se “pular os atravessadores”.
Garantir espaços de participação popular nos diferentes níveis da federação, como os Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional, é algo de grande relevância. Os conselhos se constituem como espaços de construção e avaliação de políticas públicas essenciais no diagnóstico e na resolução dos desafios da nossa Segurança Alimentar.
Vale lembrar a importância da retomada e ampliação do PAA – Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar, incluindo todas as suas ramificações: aquisição de alimentos para escolas, creches, hospitais, presídios e outras instituições. Isso já tem sido feito e pode ser ainda ampliado, já que se mostrou uma política de enorme eficiência na garantia de Segurança Alimentar e Nutricional.
No entanto, é importante que se diga: nada disso será suficiente se não ampliarmos a área produtiva e, portanto, a oferta de alimentos. A Agricultura Familiar, principal responsável pela produção de itens da cesta básica, ocupa apenas cerca de 23% da área agricultável. Existe, sim, queda da produção de itens fundamentais da nossa cesta básica, como arroz, feijão e mandioca, no Brasil. E isso também pressiona os preços.
É parte fundamental do controle dos preços, portanto, que se encare um dos maiores problemas estruturais do nosso país: a concentração fundiária. A realização da Reforma Agrária e a garantia dos direitos territoriais de populações que são também produtoras de alimentos saudáveis são condições fundamentais para a manutenção de preços acessíveis para os alimentos saudáveis. Isso significa mais famílias produzindo e, portanto, mais oferta.
Distribuição de terras e proteção à posse, para que esta não retorne ao mercado, criação de infraestrutura, em particular o acesso à água, associadas a políticas de abastecimento, são condições fundamentais para a realização da soberania alimentar da população brasileira.
Ignorar o fato de que há um problema de produção para oferta interna de alimentos não nos levará a soluções estruturais. Surpreende como setores progressistas se esquecem do papel da Reforma Agrária na produção de alimentos saudáveis. Ela sozinha não resolveria todo o problema. Mas ignorar a sua ausência certamente tornará as demais soluções, no mínimo, insuficientes.
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