Preços dos Alimentos em 2024 – Avaliação de seus componentes

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José Giacomo Baccarin & Gustavo Jun Yakushiji | 04/02/2025

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Apresentação

Diante do atual e acalorado debate sobre inflação de alimentos no Brasil, apresentamos os dados compilados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre os diversos componentes do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) e de um dos seus nove grupos, o IPAB (Índice de Preços de Alimentação e Bebidas), de 2024.

Usamos a sistemática de classificação própria do IBGE, grupos, subgrupos, itens e subitens. Adicionalmente, reorganizamos os subitens por cadeias agroalimentares e por agrupamentos de acordo com o propósito e o grau de processamento dos produtos (BACCARIN et al., 2024; MONTEIRO et al., 2018).

Sem preocupação de apontar as suas causas, a intenção é apresentar as variações de 2024, indicando as principais origens do encarecimento relativo dos alimentos. Além da variação de preços em si, calculamos a contribuição de cada componente na variação de preços, levando em conta sua participação porcentual nos gastos de consumo no Brasil, de acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2017/18 (IBGE, 2020).

No mais das vezes, usam-se médias ponderadas pela importância do componente no consumo das famílias. Em alguns casos, devidamente apontados, usam-se médias aritméticas simples.

Alimentação e Bebidas e Outros Grupos do IPCA

A Tabela 1 revela que Alimentação e Bebidas foi o grupo que teve a maior variação de preços, 7,7%, e contribuição para o IPCA, 31,2%, em 2024. Outros três grupos tiveram variação de preços acima do IPCA, que foi de 4,8%. São eles Educação, Saúde e Cuidados Pessoais e Despesas Pessoais. Saúde e Cuidados Pessoais foi o segundo grupo em termos de contribuição para variação do IPCA e Transportes, o terceiro. Neste caso, sua variação de preços foi relativamente pequena, 3,3%, mas sua participação nos gastos do consumidor, de 20,6%, é a maior entre todos os grupos, pouco acima do grupo Alimentação e Bebidas, de 19,3%.

Tabela 1 – Variação de preços e contribuição para inflação ao consumidor dos grupos do IPCA, em ordem decrescente de variação, Brasil, 2024 | Fonte IBGE (2025)
Tabela 1 – Variação de preços e contribuição para inflação ao consumidor dos grupos do IPCA, em ordem decrescente de variação, Brasil, 2024 | Fonte IBGE (2025)

Subgrupos e Itens de Alimentação e Bebidas

O grupo Alimentação e Bebidas é dividido em dois subgrupos, Alimentação no Domicílio, com participação de 69,7%, e Alimentação Fora do Domicílio, com participação de 30,3%. O Índice de Preços da Alimentação no Domicílio (IPAD) teve maior crescimento, 8,2%, do que o Índice de Preços da Alimentação Fora do Domicílio (IPAF), de 6,3%, também acima do IPCA. Ressalte-se que 8,2% do IPAF é uma média ponderada pela importância de cada item. A média simples seria menor, de 5,7%.

A Tabela 2 mostra o acontecido com os itens da Alimentação no Domicílio. Uma primeira observação é que houve dispersão na variação de preços dos itens, desde um aumento de 20,8%, nas Carnes, a uma queda de 21,2%, em Tubérculos, Raízes e Legumes. Entre os cinco itens com variação de preços acima de 10%, três deles juntos tiveram contribuição de 76,4% na variação de preços da Alimentação no Domicílio: Carnes, Bebidas e Infusões e Leite e Derivados.

Os cortes bovinos representam 87,3% do item Carnes, a carne suína, 12,6% e a de carneiro, apenas 0,1%. Este item apresentou variação de 20,8% nos preços e teve contribuição de 45,1% no encarecimento da Alimentação no Domicílio.

Em Bebidas e Infusões, o subitem café moído tem participação de 18,2% e registrou aumento de preço de 39,6%. Isto foi decisivo para que o item, como um todo, tivesse aumento de 14,2% e contribuição de 18,0% no aumento de preço da Alimentação no Domicílio.

Tabela 2 – Variação de preços e contribuição dos itens da Alimentação no Domicílio, em ordem decrescente de variação, Brasil, 2024. | Fonte: IBGE (2025)
Tabela 2 – Variação de preços e contribuição dos itens da Alimentação no Domicílio, em ordem decrescente de variação, Brasil, 2024. | Fonte: IBGE (2025)

No Leite e Derivados, merece ser destacado o leite longa vida, que representa 39,3% do item e apresentou aumento de preços de 18,8%. Os lácteos com maior nível de processamento tiveram aumentos menores, três entre 5% e 10% e quatro, abaixo de 5%.

Óleos e Gorduras e Frutas também tiveram aumentos expressivos de preços, mas com contribuição bem menos significativa. O preço do óleo de soja aumentou em 29,2% e, nas Frutas, o encarecimento dos cítricos pode ser destacado, em especial o da laranja-pera, cujo preço elevou-se em 48,4%.

O item Panificados tem grande participação nos gastos com Alimentação no Domicílio, de 11,6% e o item Aves e Ovos, de 8,3%. Respectivamente, seus preços variaram 2,5% e 6,5%, em 2024, não resultando em pressões mais significativas na inflação de alimentos.

Nível de Processamento e Variação de Preços

Monteiro et al. (2018) fazem uma classificação dos alimentos em quatro agrupamentos, de acordo com o propósito e o grau de processamento: G1 – alimentos in natura ou minimamente processados; G2 – ingredientes culinários processados; G3 – alimentos processados e; G4 – alimentos ultraprocessados. Fez-se uma adaptação no G1, destacando-se os alimentos minimamente processados em novo agrupamento o G1.1.

As variações de preços e contribuições para o aumento da Alimentação no Domicílio encontram-se na Tabela 3. No G1, com 46 subitens, estão arroz, feijão, frutas, legumes e verduras e ovo de galinha. Sua variação média ponderada de preços foi reduzida, com contribuição de apenas 3,3% no IPAD.

Tabela 3 – Variação de preços e contribuição de agrupamentos na Alimentação no Domicílio, de acordo com o propósito e grau de processamento, Brasil, 2024. | Fonte: IBGE (2025)
Tabela 3 – Variação de preços e contribuição de agrupamentos na Alimentação no Domicílio, de acordo com o propósito e grau de processamento,
Brasil, 2024. | Fonte: IBGE (2025)

No G1.1 encontram-se os cortes de carne bovina, a carne suína e de aves, os lácteos, peixes, alguns farináceos e massas, café moído e solúvel e outras infusões. Sua contribuição para o aumento de preços no domicílio, de mais de 70%, foi a maior, em decorrência de sua grande participação nos gastos das famílias e também porque sua variação de preço foi relativamente alta, puxada pelas carnes, leite e café.

O G2 teve elevação de preço acima do IPCA, especialmente devido ao acontecido com o óleo de soja, com elevação de 29,2%, e no azeite de oliva, aumento de 21,5%. Por sua vez, açúcar cristal e refinado, praticamente, mantiveram seus preços em 2024. A contribuição para encarecimento dos alimentos no domicílio foi pequena, porque os consumidores gastam relativamente pouco com este agrupamento.

No G3 e no G4, os aumentos foram menos expressivos, abaixo do IPCA. Em parte, isto é uma boa notícia, mesmo porque o G4 tem grande participação na Alimentação no Domicílio. Entretanto, o barateamento relativo dos produtos com maior grau de processamento, o que se revela desde 2007, implica no aumento de sua participação no consumo físico das famílias, em detrimento de produtos com melhor valor nutricional, os in natura e minimamente processados (IBGE, 2020; BACCARIN et al., 2024).

Contribuição das Cadeias Agroalimentares para Inflação dos Alimentos

As cadeias agroalimentares foram agrupadas em: a) comercializável – com exportação ou importação superior a 10% da produção nacional; b) medianamente comercializável – exportação ou importação entre 3% e 10% da produção nacional; c) não comercializável – com exportação ou importação abaixo de 3% da produção nacional; d) não classificada – agrupamentos de produtos ou composta por várias matérias primas agrícolas.

Os resultados encontram-se na Tabela 4. Um primeiro ponto que chamamos atenção é a diferença entre variação média simples e variação média ponderada. No caso das medianamente comercializáveis, a primeira foi de 0,9%, puxada pela queda no preço da batata, e a segunda, de 7,3%, decorrente do aumento dos preços dos lácteos. Estes têm maior participação nos gastos do consumidor que a batata, que, por sua vez, teve variação absoluta de preços maior.

Tabela 4 - Variação de preços e contribuição de subitens de cadeias agroalimentares na Alimentação no Domicílio, de acordo com a exposição ao comércio exterior, Brasil, 2024 | Fonte: IBGE (2025)
Tabela 4 – Variação de preços e contribuição de subitens de cadeias agroalimentares
na Alimentação no Domicílio, de acordo com a exposição ao comércio exterior,
Brasil, 2024 | Fonte: IBGE (2025)

Em termos de impacto nos gastos do consumidor, a média ponderada é a que deve ser considerada, como o faz o IBGE na divulgação do IPCA. Em termos da percepção da população, aumentos muito altos em produtos com menor importância no consumo, como alho, mamão ou laranja-lima, talvez, conduzam a uma avaliação negativa da variação do conjunto de preços, mesmo que ela seja menos significativa.

O conjunto das comercializáveis foi o que apresentou a maior variação de preços e contribuição para a elevação do Índice de Preços da Alimentação no Domicílio. A participação de seus subitens no consumo domiciliar representa 54,0% dos gastos do consumidor com Alimentação no Domicílio e, em 2024, foi responsável por 75,1% da elevação de seus preços.

Entre suas cadeias, a maior pressão sobre os preços ao consumidor veio da bovinocultura de corte, seguida pelo café, avicultura de corte, laranja e citrus e suinocultura. A laranja e citrus teve o maior aumento de preços, seguido por café, bovinocultura de corte, cacau e avicultura de corte.

Nos demais agrupamentos, a contribuição para o aumento de preços da Alimentação no Domicílio foi menor que suas respectivas participações nos gastos do consumidor. Destaque-se o caso dos não comercializáveis, em que essa diferença alcançou 10 pontos percentuais. Ainda nesse agrupamento, vale apontar a variação negativa de seus preços, puxada pelo acontecido em avicultura de postura e tomate.

Um comentário metodológico merece ser feito em relação ao agrupamento não classificado. Eles foram assim considerados por não se conseguir identificar, especificamente, a atividade agropecuária que lhes dá origem. Talvez, fosse mais adequado, reclassificá-los levando em conta apenas a relação entre os fluxos do comércio internacional e a produção nacional, medidos em termos monetários, o que não seria possível no caso do conjunto Indefinido.   

Referências

BACCARIN, J.G.; CAMARGO, R.A.L.; FONSECA, A.E., YAKUSHIJI, G.J.. Manifestação e causas da inflação de alimentos no Brasil, 2007 a 2023. In: 62º. Congresso SOBER.  Anais… 2024, Piracicaba (SP).

IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-18 – Avaliação nutricional da disponibilidade domiciliar de alimentos no Brasil. IBGE, Rio de Janeiro, 2020.

IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Índice de Preços ao Consumidor Amplo. Sistema IBGE de Recuperação Automática – SIDRA, 2025. Disponível em:  https://sidra.ibge.gov.br/home/ipca/brasil. Acesso em: 7 fev. 2025.

MONTEIRO C. A.; CANNON G.; MOUBARAC J. C.; LEVY R. B.; LOUZADA M. L. C.; JAIME P. C. The UN Decade of Nutrition, the NOVA food classification and the trouble with ultra-processing. Public Health Nutrition, v. 21, n. 1, p. 5-17, 2018. https://doi.org/10.1017/S1368980017000234.

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José Giacomo Baccarin é Professor de Economia Rural e Política Agrícola junto à UNESP, campus de Jaboticabal (SP). Credenciado na Pós-Graduação em Geografia na UNESP, campus de Rio Claro (SP). Diretor do Instituto Fome Zero.
Gustavo Jun Yakushiji é Engenheiro Agrônomo e Mestrando em Estatística e Experimentação Agronômica pela ESALQ/USP.